Este blog foi criado por alunos do Pólo da UAB de São Francisco de Paula, acadêmicos do curso de Licenciatura em Pedagogia da UFPEL na modalidade EAD (2011 - 2014), para que através dele possamos trocar ideias, aprendermos juntos sobre essa profissão iluminada que é a de professor e juntos chegar ao nosso objetivo. Esperamos que gostem e possam contribuir conosco nessa cominhada longa, porém prazerosa.
domingo, 28 de julho de 2013
sábado, 27 de julho de 2013
A IMPORTÂNCIA DA LÍNGUA DE SINAIS NA EDUCAÇÃO DO SURDO NA ESCOLA REGULAR.
Adriana Costa do Nascimento*
Carmem da Silva Mascarenhas*
RESUMO
Este artigo tem como objetivo evidenciar a importância da língua de sinais na educação dos surdos em classes regulares. Para a realização desta, foi feito uma pesquisa bibliográfica para reflexões, estudo e embasamento sobre os assuntos pertinentes ao tema apresentado, destacando-se analises acerca da língua de sinais e suas caracterização do surdo desde a perda auditiva até a formação de sua identidade cultural surda, bem como no desenvolvimento cognitivo e participação no contexto das escolas normais no processo de escolarização destes alunos. Como metodologia optou-se por um estudo de campo dentro de um enfoque qualitativo e quantitativo onde foram aplicados questionários com 30 professores em três instituições de ensino no município de Salvador-Ba. Através das respostas desses educadores, com suas respectivas opiniões pode-se observar suas dificuldades comunicativas com estes sujeitos, confirmando-se a grande importância do uso desta forma de linguagem na educação dos surdos em escolas regulares, evidenciando-se a necessidade de uma educação bilíngüe que valorize a língua natural do surdo, dando condições para que este possa desenvolver-se para a vida social, a cidadania e para o trabalho.
Palavras – chave: Língua de Sinais, Educação dos Surdos, Escola Regular.
INTRODUÇÃO
Discutir sobre a educação dos surdos e como ela deve acontecer no contexto escolar têm sido motivos polêmicos, pois não basta somente que seja incluído em classes normais, mas principalmente que seja atendido nas suas necessidades lingüísticas.
Postos à margem das questões sociais, culturais, e educacionais os surdos não são vistos pela sociedade por suas potencialidades, mas pelas limitações impostas por sua condição. A definição desse sujeito como um ser deficiente e, portanto incapaz, deve-se não somente à forma incompreensiva da sociedade analisar a surdez, mas principalmente devido a um atraso na aquisição da linguagem que os surdos têm no seu desenvolvimento, já que, na maioria das vezes, o acesso a ela é inexistente.
Esse atraso envolve todos os aspectos da aprendizagem e do desenvolvimento cognitivo dos portadores de surdez, provocando dificuldades de desenvolver abstração de conceitos, prendendo o surdo às situações puramente concretas. Sabe-se que a criança percebe o mundo através da linguagem, que se converte em parte essencial do seu desenvolvimento global. A linguagem planeja e regula as ações humanas e é uma evolução dos primeiros intercâmbios sociais e comunicativos.
A maioria das crianças surdas não tem acesso a este mecanismo de desenvolvimento. Como então aprendem? Como se comunicam? Como se desenvolvem? Como se dá sua aprendizagem?
Diante de tais reflexões esta pesquisa tem como objetivo evidenciar a importância da língua de sinais na educação do sujeito surdo em classes regulares. A utilização da língua de sinais vem sendo reconhecida como caminho necessário para uma efetiva mudança nas condições oferecidas pela escola no atendimento escolar desses alunos, por ser uma língua viva, produto de interação das pessoas que se comunicam não de forma oral, mas visual. Esse tipo de linguagem, assim como a oral possui riquezas lingüísticas e oferece as mesmas possibilidades de constituição de significados, além de cumprir um papel fundamental na educação dos surdos, não podendo ser ignorado pela escola no processo ensino e aprendizagem deste educando e constitui uma base para sua comunicação.
Para tais reflexões e realização desta pesquisa, foram utilizados como aporte teórico citações bibliográfica de autores como Carlos Skilar, Ronice Quadros, Paula Botelho, Gladis Perlin, Vygotsky, Marchesi entre outros, pois desenvolvem análises de grande importância para a compreensão do problema apresentado, bem como documentos legais que defendem meios que favoreçam a educação dos portadores de deficiência, em específico uso da língua de sinais na educação do sujeito surdo. Do ponto de vista metodológico, este trabalho será desenvolvido através de pesquisa bibliográfica para ilustrar a fundamentação teórica.
Pela extensão desta pesquisa, estudos posteriores podem ser desenvolvidos com objetivo de aprofundar questões mais específicas na educação dos surdos. O importante é que a sociedade possa oferecer meios para o desenvolvimento intelectual e psicossocial do surdo, reconhecendo-o em seu potencial e valorizando-o em sua diferença, na busca de uma sociedade inclusiva e igualitária.
1- A LÍNGUA DE SINAIS
A língua de sinais, ao longo dos anos, vem suscitando debates e embates acerca do seu uso, tanto na sociedade como na escola, embora muitos ainda desconheçam que ela constitua uma verdadeira linguagem.
Para Marchesi (in Cool, Palácios e Marchesi, 1995), a falta de conhecimento acerca desta língua, a confiança numa metodologia oral e por ser considerada apenas como mímica, motivaram a cultura hegemônica ouvinte a estigmatizarem e condenarem o uso desta língua considerando-a imprópria na educação do surdo por ser prejudicial à aquisição da linguagem oral, bem como a sua integração na sociedade.
Estes motivos perderam força com o tempo e o avanço nas pesquisas lingüísticas acerca dessa língua trouxe como conseqüência o seu reconhecimento lingüístico e atualmente já tem status lingüístico, ou seja, já é reconhecida como língua. A língua de sinais é a língua natural dos surdos, mas para entender esta língua com suas características e peculiaridades faz-se necessário entender o conceito de língua e a sua importância na comunicação.
Segundo Ferreira (1999), língua é o conjunto das palavras e expressões faladas ou escritas, usadas por um povo ou uma nação e o conjunto de regras da sua gramática. Diante desse conceito, analisa-se que a língua exerce um papel social, de compartilhamento de forma falada e escrita por pessoas de uma comunidade lingüística. A maioria dos surdos, não falam, como então eles se comunicam com o mundo que o cercam?
Em resposta a esta pergunta Reily (2004, p.117), defende que “quando a voz não pode ser usada, o gesto é uma opção natural para a constituição da linguagem”. Portanto, se não podemos falar, temos que buscar meios adequados que supram as funcionalidades da língua oral. Relacionando as línguas orais com as línguas de sinais, temos a fala e o sinal.
Segundo Ferreira (1999), a fala é a ação ou faculdade de falar, e sinal é signo convencionado que serve para transmitir informação. Verificando o conceito de sinal e pensando na língua sinalizada, percebe-se que quando o gesto representa um sinal convencional e possui contexto lingüístico com significado, enquadra-se então na definição de língua, servindo, portanto, para exercer comunicação, interação, substituindo assim, a fala.
É cientificamente comprovado que o ser humano possui dois sistemas para a produção e reconhecimento da linguagem: o sistema sensorial faz uso da anatomia visual, auditiva e vocal, característica das línguas orais; e o sistema motor que faz uso da anatomia visual, da anatomia da mão e do braço, caracterizando as línguas de sinais. Essa é considerada a língua natural do surdo e é imprescindível no seu desenvolvimento psicossocial e intelectual.
Na aquisição da linguagem, os surdos utilizam o sistema motor porque apresentam o sistema sensorial (audição) seriamente prejudicado. Assim, o sinal é a língua do surdo e, no aspecto funcional, é igual à fala para os ouvintes, pois possui sintaxe, gramática e semântica completas que permitem desenvolver a expressão de emoção e articulação de idéias.
Segundo Quadros (2006), a língua de sinais é uma língua espacial visual, pois utiliza a visão para captar as mensagens e os movimentos, principalmente das mãos, para transmití-la. Distinguem-se das línguas orais pela utilização do canal comunicativo, enquanto as línguas orais utilizam canal oral-auditivo, as línguas de sinais utilizam canal gestual-visual.
Esta forma de linguagem é rica, completa, coexiste com as línguas orais, mas é independente e possui estrutura gramatical própria e complexa, com regras fonológicas, morfológicas, semânticas, sintáticas e pragmáticas. É lógica e serve para atingir todos os objetivos de forma rápida e eficiente na exposição de necessidades, sentimentos, desejos, servindo plenamente para alimentar os processos mentais.
Marchesi (1995, p. 219) afirma que “A língua de sinais é uma linguagem autêntica, com uma estrutura gramatical própria e com possibilidades de expressão em qualquer nível de abstração”. Por ser tão completa quanto à língua oral é adequada, pode e deve ser utilizada no processo ensino e aprendizagem, exercendo o desenvolvimento, a comunicação e a educação dos alunos marcados por uma falta, a audição.
A língua de sinais adquiriu status lingüístico de direito e de fato em 2002, com a sanção da lei nº. 10436, que a reconhece legalmente como forma de expressão, com sistema lingüístico visual-motor próprio para exercer comunicação.
Diante destas análises acerca da língua de sinais, ao longo deste estudo, será possível compreender os conteúdos abordados no que tange à sua importância na educação dos surdos nas classes normais, salientando que a criança surda pode desenvolver-se, comunicar-se e aprender, desde que tenha suas necessidades lingüísticas supridas.
1.1- BASES HISTÓRICAS DA LÍNGUA DE SINAIS NA EDUCAÇÃO DOS SURDOS
Conhecer a base histórica sobre a educação de surdos e a língua de sinais é um passo necessário para iniciar um estudo que tem por objetivo destacar a importância da língua de sinais na educação desse sujeito.
No decorrer da história, a surdez foi alvo de incompreensão, apresentada apenas por aspectos negativos onde os surdos foram vistos de várias formas, desde loucos, doentes até como pessoas castigadas pelos deuses. Considerados primitivos até o século XV, estes viviam à margem da sociedade, pois eram considerados ineducáveis, portanto não tinham direitos, principalmente à educação.
Segundo Soares (1999), nos meados do século XVI, Gerolamo Cardano (1501-1576) propôs um conjunto de princípios que prometia uma ajuda educacional e social para os deficientes auditivos, afirmando que podiam ser pensantes e poderiam aprender e o melhor seria por meio da escrita. Neste período, surgiram os primeiros educadores de surdos.
Estes educadores desenvolveram seus ensinos em diferentes direções e suas opções teóricas situaram-se entre dois extremos: o oralismo e a posição gestualista. Para compreender melhor este processo, será interessante analisar a história da educação dos surdos e o uso da língua de sinais, bem como a tentativa de oralizar o surdo. Se alguns educadores de surdos não mediam esforços para fazê-lo falar, outros criaram e adaptaram técnicas e metodologia especifica para ensinar os surdos nas suas diferenças lingüísticas.
O primeiro professor de surdos reconhecido pela história foi o padre espanhol Pedro Ponce de Lion (1520-1584), monge beneditino que ensinou a ler e a escrever, fazer cálculos e falar. Ele deixou uma escola de professores para surdos. Em 1620, na Espanha, Juan Pablo Bonet (1579-1629) publica o primeiro livro sobre educação de surdos intitulado de “Redação das Letras e Arte de Ensinar os Mudos a Falar”, que consiste no aprendizado do alfabeto manual.
Em 1760, o abade Charles Michel de L’Epée (1712-1789) estudou e adaptou o método gestual que era a fusão da língua de sinais com a gramática sinalizada. Foi com abade, em sua própria casa, que surgiu uma escola pública para surdos.
Embora L’Epée tenha comprovado que seu método com o uso de sinais era eficaz, foi muito criticado por educadores oralistas alemães, entre eles Samuel Heincke (1729-1790), que desenvolveu o método oralista que atribuía grande valor a fala.
Nos Estados Unidos, no final do século XX, as discussões e disputas acerca da educação do surdo ganharam força, principalmente entre Eduard Minner Gallaudet (1837-1917) e Alexandre Graham Bell (1847-1922), ambos filhos de mães surdas, que desenvolveram atividades e metodologias na área da surdez, porém seguiam filosofias diferentes, Gallaudet era a favor da abordagem manual e Graham Bell era representante do método oralista.
Em meio a tantos embates acerca das duas posições, o método oral ganha força e em 1880 define-se uma nova corrente na educação dos surdos, o oralismo e o uso da língua de sinais, em todas as suas formas, foi então proibido e estigmatizado.
Durante quase cem anos existiu o chamado “Império Oralista” e neste período os professores surdos já existentes nas escolas foram afastados e proibidos de usar a língua de sinais de seus países, tanto dentro quanto fora da sala de aula. Era comum a prática de amarrar as mãos das crianças para impedi-las de fazer sinais.
No Brasil, aconteceu a mesma coisa e os surdos que utilizavam o método oralista apresentaram níveis elevados de fracasso e evasão escolar, não havendo assim evolução na aprendizagem desses sujeitos. Entretanto, os alunos surdos oriundos de vários centros urbanos, sinalizavam entre si, criando o momento propício para a constituição de uma língua de sinais brasileira.
Segundo Reily (2004,114), “A língua de sinais que conhecemos hoje no Brasil, utilizada pelos surdos, teve origem na sistematização realizada por religiosos franceses”, mais especificamente, com a chegada do professor francês em 1855, Henest Huet, professor surdo, que, a convite de D. Pedro II, trouxe o “método combinado” criado por L’Epee, para trabalhar com surdos no Brasil.
Em 1857 foi fundada a primeira escola para surdos no Brasil, sob a lei 939 de 26 de janeiro de 1857 e o Instituto dos Surdos-mudos, hoje Instituto Nacional da Educação de Surdos (INES). Foi a partir deste instituto que surgiu da mistura da língua de sinais francesa, trazida pelo professor Huet, com a língua de sinais brasileira antiga, a Língua Brasileira de Sinais, LIBRAS.
No século XX, em 1960, William Stocke (EUA) implanta a filosofia da comunicação total na qual defendia a utilização de todos os meios para facilitar a comunicação como mímica, pantomima, gestos, sinais, estimulações auditivas, adaptação de aparelhos de amplificação sonora individual, língua de sinais, leitura labial, alfabeto manual e leitura escrita.
No ano de 1971, em Paris, a língua de sinais passou a ser novamente valorizada. Foi também discutida nos Estados Unidos, sobre a chamada “filosofia da comunicação total”. As decisões tomadas neste congresso influíram positivamente na educação do surdo em todo mundo, também no Brasil.
Atualmente no Brasil, existem muitas escolas que vêm implementando uma proposta bilíngüe na educação dos surdos, ou seja, aprendizado com metodologia apropriada da língua portuguesa e da língua de sinais brasileira. Os surdos brasileiros vêm lutando por um ensino que atenda eficazmente suas necessidades lingüísticas e culturais para que possam integrar-se e estar em condições de igualdade com ouvintes tanto na vida social, quanto na profissional.
1.2- CARACTERIZANDO PERDA AUDITIVA E CULTURA SURDA
A surdez é a perda total ou parcial do sentido da audição. Trata-se por deficiência auditiva a diminuição da capacidade de percepção normal dos sons, sendo considerado surdo o individuo cuja audição não é funcional na vida comum e hipoacúsico, aquele, cuja audição ainda que deficiente, é funcional com ou sem prótese auditiva.
Segundo Kirk e Gallagher (1996), a audição é geralmente medida e descrita em decibéis (dB), medida relativa da intensidade do som. Uma audição normal é representada por zero decibéis e a perda auditiva de até vinte e cinco decibéis não é considerada uma deficiência significativa. Quanto maior o número de decibéis necessários para que uma pessoa possa responder ao som, maior a perda auditiva. Por isso existem vários tipos de surdez, de acordo com os diferentes graus de perda auditiva.
Uma perda auditiva de vinte e sete até quarenta dB é considerada como surdez leve e impede a pessoa de perceber sons distantes e os fonemas das palavras, mas não impede a aquisição normal da língua oral. A pessoa com surdez moderada apresenta perda auditiva entre quarenta e um a setenta decibéis ocasionando atraso de linguagem e alterações articulatórias.
Já a pessoa considerada como surda é aquela com surdez severa com perda auditiva entre setenta e um a noventa decibéis e o individuo consegue ouvir apenas sons próximos. Por fim a surdez profunda é a perda superior a noventa e um decibéis, privando o individuo de informações auditivas necessárias para perceber e identificar a voz humana, impedindo-o de adquirir a língua oral, fazendo-se necessário, nesse caso o uso da língua de sinais.
A dificuldade de comunicação dos surdos, ao longo da história, lhes trouxe muitos problemas. A falta desse mecanismo foi motivo de perseguição, segregação e exclusão. A visão da sociedade ouvinte sobre a surdez sempre foi preconceituosa - classificando esta deficiência como maldição, loucura, patologia e, para muitos, deficiência mental - colocou estes sujeitos à margem do mundo social, político, econômico, educacional e cultural, impedindo-os de exercer sua cidadania, impondo-os as decisões da cultura hegemônica ouvinte no que diz respeito a questões que lhe são pertinentes, como as questões educacionais e sobre a sua integração na sociedade, na escola e no mercado de trabalho, bem como na sua linguagem, não considerando seu crescimento e auto-realização.
A surdez ainda está associada à experiência da falta, da deficiência, porém vale ressaltar também é “uma diferença a ser politicamente reconhecida” (Skliar, 2005). Percebida e aceita a surdez como diferença, o surdo deve ser compreendido mais claramente em suas angústias, expectativas e demandas individuais e sociais.
As barreiras comunicativas criam dificuldades de desenvolvimento das estruturas mentais dos surdos, embora se saiba que estes possuem desenvolvimento cognitivo compatível de aprender como qualquer ouvinte, portanto a ênfase não deve ser dada à falta, à deficiência da audição, mas a dimensão lingüística e cultural que caracteriza a diferença do surdo.
O surdo não é diferente porque não ouve, mas porque desenvolve potencialidades psicológicas e culturais diferentes dos ouvintes, que são baseadas na linguagem e na experiência visual. A pessoa surda vivencia a falta de audição num mundo de sons, o que a impede de adquirir naturalmente a linguagem oral usada pela comunidade majoritária, baseando-se nessa diferença sua identidade é construída, utilizando estratégias cognitivas, comportamentais e culturais diferentes da maioria dos ouvintes.
Para Perlin in Skliar (2005, p. 57), “(...) a identidade surda se constrói dentro de uma cultura visual, essa diferença precisa ser entendida não como uma construção isolada, mas como construção multicultural”. Desta forma, entende-se que a identidade dos surdos é o conjunto de traços que o distingue dos ouvintes, representada por uma cultura específica, resultante das interações entre surdos.
A identidade cultural surda é formada através do pertencimento a uma cultura, por isso, o surdo está sempre em situação de necessidade com o outro igual, sendo a cultura surda o local onde o surdo constrói sua subjetividade de forma a assegurar a sua sobrevivência e a ter seu status dentro das múltiplas culturas.
Nesse sentido aqui abordado, cultura é a forma global de vida ou a experiência vivida de um grupo social, é definida como um campo de forças subjetivas que se expressam através da linguagem, dos juízos de valor, da arte, das motivações, etc., gerando a ordem de um grupo, com seus códigos próprios, sua forma de organização e de solidariedade.
Para Quadros (2001), a cultura surda tem características peculiares, específicas diante das demais culturas. Multifacetada, é própria do surdo, se apresenta de forma visual onde o pensamento e a linguagem são de ordem visual e por isso é tão difícil de ser compreendida pela cultura ouvinte.
O surdo percebe o mundo de forma diferenciada dos ouvintes, através de uma experiência visual e faz uso de uma linguagem especifica para isso - a língua de sinais. Esta língua é, antes de tudo, a imagem do pensamento dos surdos e faz parte da experiência vivida da comunidade surda. Como artefato cultural, a língua de sinais também é submetida à significação social a partir de critérios valorizados, sendo aprovada como sistema de linguagem rica e independente.
Um outro aspecto importante da cultura dos surdos é a adoção de uma ética da vida em seus comportamentos, pois, para os surdos, o que valida a ação é se ela atende ou não aos objetivos e necessidades básicas da vida, ou seja, sobrevivência, prazer e satisfação plena dessas necessidades.
Conclui-se que, quando visto sob o aspecto da deficiência, o surdo é caracterizado por algo que lhe falta, a audição; mas visto sob um novo olhar - o olhar das diferenças - é caracterizado como um sujeito que possui realmente a perda auditiva, mas possui também uma identidade política própria e faz parte de uma cultura rica e tem a sua língua. Vale-se ressaltar, porém, que nem todos os deficientes auditivos têm acesso a sua cultura, a sua linguagem, a sua identidade cultural, alguns por falta de conhecimento, outros por exigências familiares, por preconceitos (Botelho, 2002) negam-se ao direito de se comunicarem na sua língua natural, a língua sinalizada.
A escola precisa estar aberta à cultura surda, precisa reconhecê-la como cultura, precisa proporcionar meios para que seus educandos surdos não sejam vistos apenas como o deficiente auditivo, mas como alguém que possui uma identidade cultural própria, significativa com características próprias. Esta instituição precisa proporcionar recursos lingüísticos para que o surdo possa se desenvolver de forma autônoma, preparando-o para enfrentar desafios, não o vendo sob o ângulo da surdez, mas da diferença.
1.3- O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DO SUJEITO SURDO.
Estudiosos e pesquisadores da surdez asseguram que os surdos passam por muitas dificuldades ao longo de suas vidas, tanto no aspecto social, como no desenvolvimento psicológico e acadêmico. Consideram que tais dificuldades estão diretamente relacionadas com a questão do desenvolvimento lingüístico devido a um atraso na aquisição da linguagem desses sujeitos.
Quando ocorre esse atraso, mesmo que aprendendo tardiamente uma língua, a criança surda sempre terá conseqüências como problemas emocionais, sociais e cognitivos, pois só com a linguagem simbólica é possível operar funções mentais superiores tipicamente humanas, o que faz com que a criança aprenda e apreenda conceitos e abstrações e assim se desenvolva cognitivamente.
Esta relação entre desenvolvimento lingüístico e cognição coloca o conceito de linguagem além da função comunicativa, mas também como função reguladora e organizadora do pensamento.
Rego (1994) ao estudar Vygotsky, destaca que, nos postulados deste teórico, o mesmo defende que a linguagem é de suma importância no desenvolvimento da criança. Ele vê este signo mediador como sendo imprescindível para o desenvolvimento humano, pois carrega em si os conceitos generalizados e elaborados pela cultura humana. Segundo este autor, a relação entre homem e o mundo não acontece de forma direta, mas mediada por sistemas simbólicos, sendo a linguagem uma construção cultural da humanidade, o sistema básico das sociedades e o principal aspecto para a construção da cognição humana.
Através destes estudos pode-se perceber a importância das relações sociais e lingüísticas no desenvolvimento das crianças. A criança surda por estar num meio social que faz uso da língua oral, é privada deste contato social de informações lingüísticas. A dificuldade e acesso a um código simbólico ou a sua língua natural - a língua de sinais - mantém sua atividade cognitiva orientada pelas percepções de outros órgãos dos sentidos, produzindo um tipo de pensamento mais concreto, já que é por meio da linguagem que a criança pode desvincular-se cada vez mais do concreto e internalizar conceitos abstratos.
Conforme Goldfeld (2002, p.60), “Se a criança não se desvincula do ambiente concreto, ela não terá condições favoráveis de desenvolver as funções organizadoras e planejadoras da linguagem satisfatoriamente”. Através desta fala entendemos que a criança percebe o mundo, assimila conceitos através da linguagem, sem ela a mesma não se desenvolve por não abstrair conceitos complexos. Por possuir pensamento concreto, caracterizado pelo mundo visual que cerca a criança surda, as pessoas ouvintes sempre as vêem como intelectualmente incapazes ou relacionam a surdez à deficiência mental.
Há muitos questionamentos acerca do surdo, ter dificuldades de abstrair conceitos por não ter acesso à linguagem. Botelho (2002) defende que essas dificuldades, quando existem, relacionam-se com experiências lingüísticas insatisfatórias. Mesmo sendo cognitivamente igual aos ouvintes, os surdos que não adquirem uma língua têm dificuldades de perceber as relações e o contexto mais amplo das atividades em que estão inseridos, assim o seu desenvolvimento e aprendizagem ficam fragmentados. A aquisição da língua de sinais vai permitir a criança surda, mediante suas relações sociais, o acesso aos conceitos de sua cultura que passará a utilizar como seus, formando assim uma maneira de pensar, agir e ver o mundo da cultura de sua comunidade.
Embasando a fala acima, Botelho (2002, p.53) diz que, “O que falta aos surdos, sem sombra de dúvidas, é o acesso a uma língua que dominem e que lhes permita pensar como todas as complexidades necessárias disponíveis como são para qualquer um”. Quando a criança surda tem acesso a sua língua natural, ou seja, a língua de sinais, ela se desenvolve integralmente, pois tem inteligência semelhante à dos ouvintes, com ressalva que aprendem da forma visual e não oral-auditiva, assim, a surdez não significa outra coisa senão a ausência de um dos elementos que permitem fazer relações com o ambiente, à audição.
A função principal do ouvido é a de receber, analisar os elementos sonoros do ambiente, e decompor a realidade em partes singulares com as quais se ligam nossas reações, a fim de adaptar o mais possível o comportamento ao ambiente. Em si mesmo, o comportamento humano, na sua totalidade de reações, se excluídas aquelas ligadas aos aspectos sonoros, permanece intacto no surdo.
Surge, assim, a necessidade de se buscar outros meios de aquisição de linguagem por parte dos indivíduos surdos, os quais valorizem o sentido visual, visto que os sonoros não são efetivos. Se não for utilizada a língua de sinais, todos os outros mecanismos utilizados com o sujeito surdos serão artificiais prejudicando, inclusive, o desenvolvimento natural destas crianças. Importante então é oferecer uma educação que permita o desenvolvimento integral do individuo surdo, de forma que o desenvolva toda a sua potencialidade cognitiva.
1.4- A LÍNGUA DE SINAIS NO CONTEXTO DA ESCOLA REGULAR
Todas as pessoas têm o direito de estar na escola (Constituição Federal, Art. 205), assim Ferreira (1999) define a escola como um estabelecimento público onde se ministra o ensino de forma coletiva, porém em sua essência a escola.
(...) apresenta-se, hoje como uma das mais importantes instituições sociais, por fazer, assim como as outras, a mediação entre o indivíduo e a sociedade. Ao transmitir a cultura, e com ela, modelos sociais de comportamentos e valores morais à escola permite que a criança “humanize-se, cultive, socialize-se ou, numa palavra, eduque-se.” (Boock, 2002. P. 261).
Percebe-se então que a escola é muito importante na formação do sujeito em todos os aspectos. É um lugar de aprendizagem de diferenças e de trocas de conhecimentos, precisando, portanto atender a todos sem distinção, a fim de não promover fracassos, discriminações e exclusões (Carvalho, 2004).
Determinações constitucionais prevêem organização especial de currículos, desenvolvimento de métodos, técnicas e recursos educativos, além de professores especializados e capacitados. No caso do surdo especificamente, trata-se de promover adequações das ações educacionais à realidade daquele que tem (ou deveria ter) a língua de sinais como primeira língua.
Tais ações implicam na necessidade de uma educação bilíngüe nas classes regulares e estão respaldadas numa concepção filosófica norteadora de diretrizes legais que estabelecem uma escola alicerçada no respeito às diferenças e igual para todos, de forma a favorecer o desenvolvimento dos alunos surdos.
A Declaração de Salamanca (1994) prevê uma educação inclusiva onde todas as crianças podem aprender juntas, independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, raciais, lingüísticas ou outras. No caso do surdo sua educação é prevista em sua língua nacional de signos, a língua de sinais.
Já a LDBEN/96 (Lei das Diretrizes Bases da Educação Nacional de 1996), fundamentada em Salamanca (1994) e na Constituição Federal de 1988, traz em seus artigos especificamente 58 e 59, fundamentos e princípios para uma educação inclusiva de qualidade que atenda a todos os educandos através de adequações específicas para atender as necessidades dos portadores de deficiências.
Para Carvalho (2004) não basta apenas colocar os deficientes em classes regulares, se faz necessário assegurar-lhes garantias e práticas pedagógicas que rompam as barreiras de aprendizagem a fim de não se fazer uma educação inclusiva marginal e excludente.
Na educação dos surdos, o que lhes constitui uma barreira de aprendizagem diz respeito às questões referentes à sua linguagem. Estes sujeitos não ouvem, por isso, têm grandes dificuldades em se comunicar e aprender, embora sejam iguais aos ouvintes, as precisam de uma educação diferente que o respeite na sua diferença.
Atualmente no Brasil há um crescente discurso sobre a educação bilíngüe para surdos. O termo bilingüismo significa “utilização regular de duas línguas por indivíduos, ou comunidade, como resultado de contato lingüístico” (Ferreira, 1999, p. 300). Ser bilíngüe, portanto é falar e escrever em duas línguas.
O surdo tem direito a esta educação e a mesma deve acontecer de maneira que, segundo Quadros, (2006) o português deveria ser ensinado aos surdos como segunda língua. Dessa forma a escola deveria apresentar alternativas voltadas às necessidades lingüísticas dos surdos, promovendo estratégias que permitam a aquisição e o desenvolvimento da língua de sinais, como primeira língua e, paralelamente, introduzir a língua portuguesa em sua modalidade escrita, como segunda língua. A autora discorre acerca de como deve acontecer a educação bilíngüe e o papel da escola nesse processo.
“As diferentes formas de proporcionar uma educação bilíngüe à criança em uma escola dependem de decisões político-pedagógicas. Ao optar-se em oferecer uma educação bilíngüe, a escola está assumindo uma política lingüística em que duas línguas passarão a co-existir no espaço escolar (...)”. (Quadros, 2006, p.18).
Entende-se assim que não basta somente a escola colocar duas línguas co-existindo nas suas classes, antes precisa que haja subsídios e adequações curriculares de forma a favorecer surdos e ouvintes, a fim de tornar o ensino apropriado à peculiaridade de cada aluno.
Segundo Skliar (2005, p.27), usufruir da linguagem de sinais “é um
direito dos surdos e não uma concessão de alguns professores e escolas”.
Os surdos têm plenos direitos a uma educação que privilegie a sua
língua materna e de acordo com a legislação brasileira isso não lhe deve
ser negado. No Brasil, leis e decretos garantem a estes alunos uma
educação diferenciada em classes regulares, onde sua língua nacional de
signos, aqui conhecida como LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), é
valorizada.Carmem da Silva Mascarenhas*
RESUMO
Este artigo tem como objetivo evidenciar a importância da língua de sinais na educação dos surdos em classes regulares. Para a realização desta, foi feito uma pesquisa bibliográfica para reflexões, estudo e embasamento sobre os assuntos pertinentes ao tema apresentado, destacando-se analises acerca da língua de sinais e suas caracterização do surdo desde a perda auditiva até a formação de sua identidade cultural surda, bem como no desenvolvimento cognitivo e participação no contexto das escolas normais no processo de escolarização destes alunos. Como metodologia optou-se por um estudo de campo dentro de um enfoque qualitativo e quantitativo onde foram aplicados questionários com 30 professores em três instituições de ensino no município de Salvador-Ba. Através das respostas desses educadores, com suas respectivas opiniões pode-se observar suas dificuldades comunicativas com estes sujeitos, confirmando-se a grande importância do uso desta forma de linguagem na educação dos surdos em escolas regulares, evidenciando-se a necessidade de uma educação bilíngüe que valorize a língua natural do surdo, dando condições para que este possa desenvolver-se para a vida social, a cidadania e para o trabalho.
Palavras – chave: Língua de Sinais, Educação dos Surdos, Escola Regular.
INTRODUÇÃO
Discutir sobre a educação dos surdos e como ela deve acontecer no contexto escolar têm sido motivos polêmicos, pois não basta somente que seja incluído em classes normais, mas principalmente que seja atendido nas suas necessidades lingüísticas.
Postos à margem das questões sociais, culturais, e educacionais os surdos não são vistos pela sociedade por suas potencialidades, mas pelas limitações impostas por sua condição. A definição desse sujeito como um ser deficiente e, portanto incapaz, deve-se não somente à forma incompreensiva da sociedade analisar a surdez, mas principalmente devido a um atraso na aquisição da linguagem que os surdos têm no seu desenvolvimento, já que, na maioria das vezes, o acesso a ela é inexistente.
Esse atraso envolve todos os aspectos da aprendizagem e do desenvolvimento cognitivo dos portadores de surdez, provocando dificuldades de desenvolver abstração de conceitos, prendendo o surdo às situações puramente concretas. Sabe-se que a criança percebe o mundo através da linguagem, que se converte em parte essencial do seu desenvolvimento global. A linguagem planeja e regula as ações humanas e é uma evolução dos primeiros intercâmbios sociais e comunicativos.
A maioria das crianças surdas não tem acesso a este mecanismo de desenvolvimento. Como então aprendem? Como se comunicam? Como se desenvolvem? Como se dá sua aprendizagem?
Diante de tais reflexões esta pesquisa tem como objetivo evidenciar a importância da língua de sinais na educação do sujeito surdo em classes regulares. A utilização da língua de sinais vem sendo reconhecida como caminho necessário para uma efetiva mudança nas condições oferecidas pela escola no atendimento escolar desses alunos, por ser uma língua viva, produto de interação das pessoas que se comunicam não de forma oral, mas visual. Esse tipo de linguagem, assim como a oral possui riquezas lingüísticas e oferece as mesmas possibilidades de constituição de significados, além de cumprir um papel fundamental na educação dos surdos, não podendo ser ignorado pela escola no processo ensino e aprendizagem deste educando e constitui uma base para sua comunicação.
Para tais reflexões e realização desta pesquisa, foram utilizados como aporte teórico citações bibliográfica de autores como Carlos Skilar, Ronice Quadros, Paula Botelho, Gladis Perlin, Vygotsky, Marchesi entre outros, pois desenvolvem análises de grande importância para a compreensão do problema apresentado, bem como documentos legais que defendem meios que favoreçam a educação dos portadores de deficiência, em específico uso da língua de sinais na educação do sujeito surdo. Do ponto de vista metodológico, este trabalho será desenvolvido através de pesquisa bibliográfica para ilustrar a fundamentação teórica.
Pela extensão desta pesquisa, estudos posteriores podem ser desenvolvidos com objetivo de aprofundar questões mais específicas na educação dos surdos. O importante é que a sociedade possa oferecer meios para o desenvolvimento intelectual e psicossocial do surdo, reconhecendo-o em seu potencial e valorizando-o em sua diferença, na busca de uma sociedade inclusiva e igualitária.
1- A LÍNGUA DE SINAIS
A língua de sinais, ao longo dos anos, vem suscitando debates e embates acerca do seu uso, tanto na sociedade como na escola, embora muitos ainda desconheçam que ela constitua uma verdadeira linguagem.
Para Marchesi (in Cool, Palácios e Marchesi, 1995), a falta de conhecimento acerca desta língua, a confiança numa metodologia oral e por ser considerada apenas como mímica, motivaram a cultura hegemônica ouvinte a estigmatizarem e condenarem o uso desta língua considerando-a imprópria na educação do surdo por ser prejudicial à aquisição da linguagem oral, bem como a sua integração na sociedade.
Estes motivos perderam força com o tempo e o avanço nas pesquisas lingüísticas acerca dessa língua trouxe como conseqüência o seu reconhecimento lingüístico e atualmente já tem status lingüístico, ou seja, já é reconhecida como língua. A língua de sinais é a língua natural dos surdos, mas para entender esta língua com suas características e peculiaridades faz-se necessário entender o conceito de língua e a sua importância na comunicação.
Segundo Ferreira (1999), língua é o conjunto das palavras e expressões faladas ou escritas, usadas por um povo ou uma nação e o conjunto de regras da sua gramática. Diante desse conceito, analisa-se que a língua exerce um papel social, de compartilhamento de forma falada e escrita por pessoas de uma comunidade lingüística. A maioria dos surdos, não falam, como então eles se comunicam com o mundo que o cercam?
Em resposta a esta pergunta Reily (2004, p.117), defende que “quando a voz não pode ser usada, o gesto é uma opção natural para a constituição da linguagem”. Portanto, se não podemos falar, temos que buscar meios adequados que supram as funcionalidades da língua oral. Relacionando as línguas orais com as línguas de sinais, temos a fala e o sinal.
Segundo Ferreira (1999), a fala é a ação ou faculdade de falar, e sinal é signo convencionado que serve para transmitir informação. Verificando o conceito de sinal e pensando na língua sinalizada, percebe-se que quando o gesto representa um sinal convencional e possui contexto lingüístico com significado, enquadra-se então na definição de língua, servindo, portanto, para exercer comunicação, interação, substituindo assim, a fala.
É cientificamente comprovado que o ser humano possui dois sistemas para a produção e reconhecimento da linguagem: o sistema sensorial faz uso da anatomia visual, auditiva e vocal, característica das línguas orais; e o sistema motor que faz uso da anatomia visual, da anatomia da mão e do braço, caracterizando as línguas de sinais. Essa é considerada a língua natural do surdo e é imprescindível no seu desenvolvimento psicossocial e intelectual.
Na aquisição da linguagem, os surdos utilizam o sistema motor porque apresentam o sistema sensorial (audição) seriamente prejudicado. Assim, o sinal é a língua do surdo e, no aspecto funcional, é igual à fala para os ouvintes, pois possui sintaxe, gramática e semântica completas que permitem desenvolver a expressão de emoção e articulação de idéias.
Segundo Quadros (2006), a língua de sinais é uma língua espacial visual, pois utiliza a visão para captar as mensagens e os movimentos, principalmente das mãos, para transmití-la. Distinguem-se das línguas orais pela utilização do canal comunicativo, enquanto as línguas orais utilizam canal oral-auditivo, as línguas de sinais utilizam canal gestual-visual.
Esta forma de linguagem é rica, completa, coexiste com as línguas orais, mas é independente e possui estrutura gramatical própria e complexa, com regras fonológicas, morfológicas, semânticas, sintáticas e pragmáticas. É lógica e serve para atingir todos os objetivos de forma rápida e eficiente na exposição de necessidades, sentimentos, desejos, servindo plenamente para alimentar os processos mentais.
Marchesi (1995, p. 219) afirma que “A língua de sinais é uma linguagem autêntica, com uma estrutura gramatical própria e com possibilidades de expressão em qualquer nível de abstração”. Por ser tão completa quanto à língua oral é adequada, pode e deve ser utilizada no processo ensino e aprendizagem, exercendo o desenvolvimento, a comunicação e a educação dos alunos marcados por uma falta, a audição.
A língua de sinais adquiriu status lingüístico de direito e de fato em 2002, com a sanção da lei nº. 10436, que a reconhece legalmente como forma de expressão, com sistema lingüístico visual-motor próprio para exercer comunicação.
Diante destas análises acerca da língua de sinais, ao longo deste estudo, será possível compreender os conteúdos abordados no que tange à sua importância na educação dos surdos nas classes normais, salientando que a criança surda pode desenvolver-se, comunicar-se e aprender, desde que tenha suas necessidades lingüísticas supridas.
1.1- BASES HISTÓRICAS DA LÍNGUA DE SINAIS NA EDUCAÇÃO DOS SURDOS
Conhecer a base histórica sobre a educação de surdos e a língua de sinais é um passo necessário para iniciar um estudo que tem por objetivo destacar a importância da língua de sinais na educação desse sujeito.
No decorrer da história, a surdez foi alvo de incompreensão, apresentada apenas por aspectos negativos onde os surdos foram vistos de várias formas, desde loucos, doentes até como pessoas castigadas pelos deuses. Considerados primitivos até o século XV, estes viviam à margem da sociedade, pois eram considerados ineducáveis, portanto não tinham direitos, principalmente à educação.
Segundo Soares (1999), nos meados do século XVI, Gerolamo Cardano (1501-1576) propôs um conjunto de princípios que prometia uma ajuda educacional e social para os deficientes auditivos, afirmando que podiam ser pensantes e poderiam aprender e o melhor seria por meio da escrita. Neste período, surgiram os primeiros educadores de surdos.
Estes educadores desenvolveram seus ensinos em diferentes direções e suas opções teóricas situaram-se entre dois extremos: o oralismo e a posição gestualista. Para compreender melhor este processo, será interessante analisar a história da educação dos surdos e o uso da língua de sinais, bem como a tentativa de oralizar o surdo. Se alguns educadores de surdos não mediam esforços para fazê-lo falar, outros criaram e adaptaram técnicas e metodologia especifica para ensinar os surdos nas suas diferenças lingüísticas.
O primeiro professor de surdos reconhecido pela história foi o padre espanhol Pedro Ponce de Lion (1520-1584), monge beneditino que ensinou a ler e a escrever, fazer cálculos e falar. Ele deixou uma escola de professores para surdos. Em 1620, na Espanha, Juan Pablo Bonet (1579-1629) publica o primeiro livro sobre educação de surdos intitulado de “Redação das Letras e Arte de Ensinar os Mudos a Falar”, que consiste no aprendizado do alfabeto manual.
Em 1760, o abade Charles Michel de L’Epée (1712-1789) estudou e adaptou o método gestual que era a fusão da língua de sinais com a gramática sinalizada. Foi com abade, em sua própria casa, que surgiu uma escola pública para surdos.
Embora L’Epée tenha comprovado que seu método com o uso de sinais era eficaz, foi muito criticado por educadores oralistas alemães, entre eles Samuel Heincke (1729-1790), que desenvolveu o método oralista que atribuía grande valor a fala.
Nos Estados Unidos, no final do século XX, as discussões e disputas acerca da educação do surdo ganharam força, principalmente entre Eduard Minner Gallaudet (1837-1917) e Alexandre Graham Bell (1847-1922), ambos filhos de mães surdas, que desenvolveram atividades e metodologias na área da surdez, porém seguiam filosofias diferentes, Gallaudet era a favor da abordagem manual e Graham Bell era representante do método oralista.
Em meio a tantos embates acerca das duas posições, o método oral ganha força e em 1880 define-se uma nova corrente na educação dos surdos, o oralismo e o uso da língua de sinais, em todas as suas formas, foi então proibido e estigmatizado.
Durante quase cem anos existiu o chamado “Império Oralista” e neste período os professores surdos já existentes nas escolas foram afastados e proibidos de usar a língua de sinais de seus países, tanto dentro quanto fora da sala de aula. Era comum a prática de amarrar as mãos das crianças para impedi-las de fazer sinais.
No Brasil, aconteceu a mesma coisa e os surdos que utilizavam o método oralista apresentaram níveis elevados de fracasso e evasão escolar, não havendo assim evolução na aprendizagem desses sujeitos. Entretanto, os alunos surdos oriundos de vários centros urbanos, sinalizavam entre si, criando o momento propício para a constituição de uma língua de sinais brasileira.
Segundo Reily (2004,114), “A língua de sinais que conhecemos hoje no Brasil, utilizada pelos surdos, teve origem na sistematização realizada por religiosos franceses”, mais especificamente, com a chegada do professor francês em 1855, Henest Huet, professor surdo, que, a convite de D. Pedro II, trouxe o “método combinado” criado por L’Epee, para trabalhar com surdos no Brasil.
Em 1857 foi fundada a primeira escola para surdos no Brasil, sob a lei 939 de 26 de janeiro de 1857 e o Instituto dos Surdos-mudos, hoje Instituto Nacional da Educação de Surdos (INES). Foi a partir deste instituto que surgiu da mistura da língua de sinais francesa, trazida pelo professor Huet, com a língua de sinais brasileira antiga, a Língua Brasileira de Sinais, LIBRAS.
No século XX, em 1960, William Stocke (EUA) implanta a filosofia da comunicação total na qual defendia a utilização de todos os meios para facilitar a comunicação como mímica, pantomima, gestos, sinais, estimulações auditivas, adaptação de aparelhos de amplificação sonora individual, língua de sinais, leitura labial, alfabeto manual e leitura escrita.
No ano de 1971, em Paris, a língua de sinais passou a ser novamente valorizada. Foi também discutida nos Estados Unidos, sobre a chamada “filosofia da comunicação total”. As decisões tomadas neste congresso influíram positivamente na educação do surdo em todo mundo, também no Brasil.
Atualmente no Brasil, existem muitas escolas que vêm implementando uma proposta bilíngüe na educação dos surdos, ou seja, aprendizado com metodologia apropriada da língua portuguesa e da língua de sinais brasileira. Os surdos brasileiros vêm lutando por um ensino que atenda eficazmente suas necessidades lingüísticas e culturais para que possam integrar-se e estar em condições de igualdade com ouvintes tanto na vida social, quanto na profissional.
1.2- CARACTERIZANDO PERDA AUDITIVA E CULTURA SURDA
A surdez é a perda total ou parcial do sentido da audição. Trata-se por deficiência auditiva a diminuição da capacidade de percepção normal dos sons, sendo considerado surdo o individuo cuja audição não é funcional na vida comum e hipoacúsico, aquele, cuja audição ainda que deficiente, é funcional com ou sem prótese auditiva.
Segundo Kirk e Gallagher (1996), a audição é geralmente medida e descrita em decibéis (dB), medida relativa da intensidade do som. Uma audição normal é representada por zero decibéis e a perda auditiva de até vinte e cinco decibéis não é considerada uma deficiência significativa. Quanto maior o número de decibéis necessários para que uma pessoa possa responder ao som, maior a perda auditiva. Por isso existem vários tipos de surdez, de acordo com os diferentes graus de perda auditiva.
Uma perda auditiva de vinte e sete até quarenta dB é considerada como surdez leve e impede a pessoa de perceber sons distantes e os fonemas das palavras, mas não impede a aquisição normal da língua oral. A pessoa com surdez moderada apresenta perda auditiva entre quarenta e um a setenta decibéis ocasionando atraso de linguagem e alterações articulatórias.
Já a pessoa considerada como surda é aquela com surdez severa com perda auditiva entre setenta e um a noventa decibéis e o individuo consegue ouvir apenas sons próximos. Por fim a surdez profunda é a perda superior a noventa e um decibéis, privando o individuo de informações auditivas necessárias para perceber e identificar a voz humana, impedindo-o de adquirir a língua oral, fazendo-se necessário, nesse caso o uso da língua de sinais.
A dificuldade de comunicação dos surdos, ao longo da história, lhes trouxe muitos problemas. A falta desse mecanismo foi motivo de perseguição, segregação e exclusão. A visão da sociedade ouvinte sobre a surdez sempre foi preconceituosa - classificando esta deficiência como maldição, loucura, patologia e, para muitos, deficiência mental - colocou estes sujeitos à margem do mundo social, político, econômico, educacional e cultural, impedindo-os de exercer sua cidadania, impondo-os as decisões da cultura hegemônica ouvinte no que diz respeito a questões que lhe são pertinentes, como as questões educacionais e sobre a sua integração na sociedade, na escola e no mercado de trabalho, bem como na sua linguagem, não considerando seu crescimento e auto-realização.
A surdez ainda está associada à experiência da falta, da deficiência, porém vale ressaltar também é “uma diferença a ser politicamente reconhecida” (Skliar, 2005). Percebida e aceita a surdez como diferença, o surdo deve ser compreendido mais claramente em suas angústias, expectativas e demandas individuais e sociais.
As barreiras comunicativas criam dificuldades de desenvolvimento das estruturas mentais dos surdos, embora se saiba que estes possuem desenvolvimento cognitivo compatível de aprender como qualquer ouvinte, portanto a ênfase não deve ser dada à falta, à deficiência da audição, mas a dimensão lingüística e cultural que caracteriza a diferença do surdo.
O surdo não é diferente porque não ouve, mas porque desenvolve potencialidades psicológicas e culturais diferentes dos ouvintes, que são baseadas na linguagem e na experiência visual. A pessoa surda vivencia a falta de audição num mundo de sons, o que a impede de adquirir naturalmente a linguagem oral usada pela comunidade majoritária, baseando-se nessa diferença sua identidade é construída, utilizando estratégias cognitivas, comportamentais e culturais diferentes da maioria dos ouvintes.
Para Perlin in Skliar (2005, p. 57), “(...) a identidade surda se constrói dentro de uma cultura visual, essa diferença precisa ser entendida não como uma construção isolada, mas como construção multicultural”. Desta forma, entende-se que a identidade dos surdos é o conjunto de traços que o distingue dos ouvintes, representada por uma cultura específica, resultante das interações entre surdos.
A identidade cultural surda é formada através do pertencimento a uma cultura, por isso, o surdo está sempre em situação de necessidade com o outro igual, sendo a cultura surda o local onde o surdo constrói sua subjetividade de forma a assegurar a sua sobrevivência e a ter seu status dentro das múltiplas culturas.
Nesse sentido aqui abordado, cultura é a forma global de vida ou a experiência vivida de um grupo social, é definida como um campo de forças subjetivas que se expressam através da linguagem, dos juízos de valor, da arte, das motivações, etc., gerando a ordem de um grupo, com seus códigos próprios, sua forma de organização e de solidariedade.
Para Quadros (2001), a cultura surda tem características peculiares, específicas diante das demais culturas. Multifacetada, é própria do surdo, se apresenta de forma visual onde o pensamento e a linguagem são de ordem visual e por isso é tão difícil de ser compreendida pela cultura ouvinte.
O surdo percebe o mundo de forma diferenciada dos ouvintes, através de uma experiência visual e faz uso de uma linguagem especifica para isso - a língua de sinais. Esta língua é, antes de tudo, a imagem do pensamento dos surdos e faz parte da experiência vivida da comunidade surda. Como artefato cultural, a língua de sinais também é submetida à significação social a partir de critérios valorizados, sendo aprovada como sistema de linguagem rica e independente.
Um outro aspecto importante da cultura dos surdos é a adoção de uma ética da vida em seus comportamentos, pois, para os surdos, o que valida a ação é se ela atende ou não aos objetivos e necessidades básicas da vida, ou seja, sobrevivência, prazer e satisfação plena dessas necessidades.
Conclui-se que, quando visto sob o aspecto da deficiência, o surdo é caracterizado por algo que lhe falta, a audição; mas visto sob um novo olhar - o olhar das diferenças - é caracterizado como um sujeito que possui realmente a perda auditiva, mas possui também uma identidade política própria e faz parte de uma cultura rica e tem a sua língua. Vale-se ressaltar, porém, que nem todos os deficientes auditivos têm acesso a sua cultura, a sua linguagem, a sua identidade cultural, alguns por falta de conhecimento, outros por exigências familiares, por preconceitos (Botelho, 2002) negam-se ao direito de se comunicarem na sua língua natural, a língua sinalizada.
A escola precisa estar aberta à cultura surda, precisa reconhecê-la como cultura, precisa proporcionar meios para que seus educandos surdos não sejam vistos apenas como o deficiente auditivo, mas como alguém que possui uma identidade cultural própria, significativa com características próprias. Esta instituição precisa proporcionar recursos lingüísticos para que o surdo possa se desenvolver de forma autônoma, preparando-o para enfrentar desafios, não o vendo sob o ângulo da surdez, mas da diferença.
1.3- O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DO SUJEITO SURDO.
Estudiosos e pesquisadores da surdez asseguram que os surdos passam por muitas dificuldades ao longo de suas vidas, tanto no aspecto social, como no desenvolvimento psicológico e acadêmico. Consideram que tais dificuldades estão diretamente relacionadas com a questão do desenvolvimento lingüístico devido a um atraso na aquisição da linguagem desses sujeitos.
Quando ocorre esse atraso, mesmo que aprendendo tardiamente uma língua, a criança surda sempre terá conseqüências como problemas emocionais, sociais e cognitivos, pois só com a linguagem simbólica é possível operar funções mentais superiores tipicamente humanas, o que faz com que a criança aprenda e apreenda conceitos e abstrações e assim se desenvolva cognitivamente.
Esta relação entre desenvolvimento lingüístico e cognição coloca o conceito de linguagem além da função comunicativa, mas também como função reguladora e organizadora do pensamento.
Rego (1994) ao estudar Vygotsky, destaca que, nos postulados deste teórico, o mesmo defende que a linguagem é de suma importância no desenvolvimento da criança. Ele vê este signo mediador como sendo imprescindível para o desenvolvimento humano, pois carrega em si os conceitos generalizados e elaborados pela cultura humana. Segundo este autor, a relação entre homem e o mundo não acontece de forma direta, mas mediada por sistemas simbólicos, sendo a linguagem uma construção cultural da humanidade, o sistema básico das sociedades e o principal aspecto para a construção da cognição humana.
Através destes estudos pode-se perceber a importância das relações sociais e lingüísticas no desenvolvimento das crianças. A criança surda por estar num meio social que faz uso da língua oral, é privada deste contato social de informações lingüísticas. A dificuldade e acesso a um código simbólico ou a sua língua natural - a língua de sinais - mantém sua atividade cognitiva orientada pelas percepções de outros órgãos dos sentidos, produzindo um tipo de pensamento mais concreto, já que é por meio da linguagem que a criança pode desvincular-se cada vez mais do concreto e internalizar conceitos abstratos.
Conforme Goldfeld (2002, p.60), “Se a criança não se desvincula do ambiente concreto, ela não terá condições favoráveis de desenvolver as funções organizadoras e planejadoras da linguagem satisfatoriamente”. Através desta fala entendemos que a criança percebe o mundo, assimila conceitos através da linguagem, sem ela a mesma não se desenvolve por não abstrair conceitos complexos. Por possuir pensamento concreto, caracterizado pelo mundo visual que cerca a criança surda, as pessoas ouvintes sempre as vêem como intelectualmente incapazes ou relacionam a surdez à deficiência mental.
Há muitos questionamentos acerca do surdo, ter dificuldades de abstrair conceitos por não ter acesso à linguagem. Botelho (2002) defende que essas dificuldades, quando existem, relacionam-se com experiências lingüísticas insatisfatórias. Mesmo sendo cognitivamente igual aos ouvintes, os surdos que não adquirem uma língua têm dificuldades de perceber as relações e o contexto mais amplo das atividades em que estão inseridos, assim o seu desenvolvimento e aprendizagem ficam fragmentados. A aquisição da língua de sinais vai permitir a criança surda, mediante suas relações sociais, o acesso aos conceitos de sua cultura que passará a utilizar como seus, formando assim uma maneira de pensar, agir e ver o mundo da cultura de sua comunidade.
Embasando a fala acima, Botelho (2002, p.53) diz que, “O que falta aos surdos, sem sombra de dúvidas, é o acesso a uma língua que dominem e que lhes permita pensar como todas as complexidades necessárias disponíveis como são para qualquer um”. Quando a criança surda tem acesso a sua língua natural, ou seja, a língua de sinais, ela se desenvolve integralmente, pois tem inteligência semelhante à dos ouvintes, com ressalva que aprendem da forma visual e não oral-auditiva, assim, a surdez não significa outra coisa senão a ausência de um dos elementos que permitem fazer relações com o ambiente, à audição.
A função principal do ouvido é a de receber, analisar os elementos sonoros do ambiente, e decompor a realidade em partes singulares com as quais se ligam nossas reações, a fim de adaptar o mais possível o comportamento ao ambiente. Em si mesmo, o comportamento humano, na sua totalidade de reações, se excluídas aquelas ligadas aos aspectos sonoros, permanece intacto no surdo.
Surge, assim, a necessidade de se buscar outros meios de aquisição de linguagem por parte dos indivíduos surdos, os quais valorizem o sentido visual, visto que os sonoros não são efetivos. Se não for utilizada a língua de sinais, todos os outros mecanismos utilizados com o sujeito surdos serão artificiais prejudicando, inclusive, o desenvolvimento natural destas crianças. Importante então é oferecer uma educação que permita o desenvolvimento integral do individuo surdo, de forma que o desenvolva toda a sua potencialidade cognitiva.
1.4- A LÍNGUA DE SINAIS NO CONTEXTO DA ESCOLA REGULAR
Todas as pessoas têm o direito de estar na escola (Constituição Federal, Art. 205), assim Ferreira (1999) define a escola como um estabelecimento público onde se ministra o ensino de forma coletiva, porém em sua essência a escola.
(...) apresenta-se, hoje como uma das mais importantes instituições sociais, por fazer, assim como as outras, a mediação entre o indivíduo e a sociedade. Ao transmitir a cultura, e com ela, modelos sociais de comportamentos e valores morais à escola permite que a criança “humanize-se, cultive, socialize-se ou, numa palavra, eduque-se.” (Boock, 2002. P. 261).
Percebe-se então que a escola é muito importante na formação do sujeito em todos os aspectos. É um lugar de aprendizagem de diferenças e de trocas de conhecimentos, precisando, portanto atender a todos sem distinção, a fim de não promover fracassos, discriminações e exclusões (Carvalho, 2004).
Determinações constitucionais prevêem organização especial de currículos, desenvolvimento de métodos, técnicas e recursos educativos, além de professores especializados e capacitados. No caso do surdo especificamente, trata-se de promover adequações das ações educacionais à realidade daquele que tem (ou deveria ter) a língua de sinais como primeira língua.
Tais ações implicam na necessidade de uma educação bilíngüe nas classes regulares e estão respaldadas numa concepção filosófica norteadora de diretrizes legais que estabelecem uma escola alicerçada no respeito às diferenças e igual para todos, de forma a favorecer o desenvolvimento dos alunos surdos.
A Declaração de Salamanca (1994) prevê uma educação inclusiva onde todas as crianças podem aprender juntas, independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, raciais, lingüísticas ou outras. No caso do surdo sua educação é prevista em sua língua nacional de signos, a língua de sinais.
Já a LDBEN/96 (Lei das Diretrizes Bases da Educação Nacional de 1996), fundamentada em Salamanca (1994) e na Constituição Federal de 1988, traz em seus artigos especificamente 58 e 59, fundamentos e princípios para uma educação inclusiva de qualidade que atenda a todos os educandos através de adequações específicas para atender as necessidades dos portadores de deficiências.
Para Carvalho (2004) não basta apenas colocar os deficientes em classes regulares, se faz necessário assegurar-lhes garantias e práticas pedagógicas que rompam as barreiras de aprendizagem a fim de não se fazer uma educação inclusiva marginal e excludente.
Na educação dos surdos, o que lhes constitui uma barreira de aprendizagem diz respeito às questões referentes à sua linguagem. Estes sujeitos não ouvem, por isso, têm grandes dificuldades em se comunicar e aprender, embora sejam iguais aos ouvintes, as precisam de uma educação diferente que o respeite na sua diferença.
Atualmente no Brasil há um crescente discurso sobre a educação bilíngüe para surdos. O termo bilingüismo significa “utilização regular de duas línguas por indivíduos, ou comunidade, como resultado de contato lingüístico” (Ferreira, 1999, p. 300). Ser bilíngüe, portanto é falar e escrever em duas línguas.
O surdo tem direito a esta educação e a mesma deve acontecer de maneira que, segundo Quadros, (2006) o português deveria ser ensinado aos surdos como segunda língua. Dessa forma a escola deveria apresentar alternativas voltadas às necessidades lingüísticas dos surdos, promovendo estratégias que permitam a aquisição e o desenvolvimento da língua de sinais, como primeira língua e, paralelamente, introduzir a língua portuguesa em sua modalidade escrita, como segunda língua. A autora discorre acerca de como deve acontecer a educação bilíngüe e o papel da escola nesse processo.
“As diferentes formas de proporcionar uma educação bilíngüe à criança em uma escola dependem de decisões político-pedagógicas. Ao optar-se em oferecer uma educação bilíngüe, a escola está assumindo uma política lingüística em que duas línguas passarão a co-existir no espaço escolar (...)”. (Quadros, 2006, p.18).
Entende-se assim que não basta somente a escola colocar duas línguas co-existindo nas suas classes, antes precisa que haja subsídios e adequações curriculares de forma a favorecer surdos e ouvintes, a fim de tornar o ensino apropriado à peculiaridade de cada aluno.
A lei 10.436 (24/04/2002) reconhece a legitimidade da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS - e com isso seu uso pelas comunidades surdas ganha respaldo do poder e dos serviços públicos. Esta lei foi regulamentada em 22 de dezembro de 2005, pelo Decreto de nº. 5.626/05 que estabelece a inclusão da LIBRAS como disciplina curricular nos cursos de magistério, pedagogia e fonoaudiologia, do ensino público e privado, e sistemas de ensino estaduais, municipais e federais (Cap.II, art. 3º.).
Este mesmo Decreto, no capítulo VI, Art. 22, incisos I e II, estabelece uma educação inclusiva para os surdos, numa modalidade bilíngüe em sua escolarização básica, garantindo-se a estes alunos, educadores capacitados e a presença do intérprete nessas classes.
O intérprete é muito importante na educação dos surdos nas classes regulares, pois é um profissional devidamente capacitado, que domina a LIBRAS, proporcionando aos surdos receber informações escolares em língua de sinais, abrindo-lhes oportunidades para que possam construir competências e habilidades na leitura e na escrita, tornando-se, portanto, letrados.
Através desses dispositivos legais, pode-se verificar que a escola regular está amparada legalmente para receber os alunos surdos em suas classes, pois a legislação brasileira já reconhece a importância da linguagem dos sinais na educação dos sujeitos surdos, como um elemento que abre portas para o desenvolvimento global dos alunos que não ouvem, mas que são iguais àqueles que têm a audição. O surdo não é pior que o ouvinte, é cognitivamente igual, tem as mesmas capacidades e inteligência (Botelho 2002), porém é um sujeito que tem uma forma única, peculiar de aprender, pois compartilha duas culturas e precisa apropriar-se de ambas. A língua de sinais constitui esta ponte, portanto, importante na educação dos surdos nas classes regulares.
2 - METODOLOGIA
2.1 MÉTODO
Diante do tema apresentado, optou-se por uma metodologia de estudo de campo embasada em uma pesquisa bibliográfica, por considerar-se um elemento fundamental na educação do sujeito surdo, o uso da língua e sinais.
2.2 AMOSTRA
A população envolvida é de professores de surdos, na qual foram selecionados 10 professores de três instituições da rede estadual de ensino regular na cidade de Salvador, totalizando 30 professores.
2.3 TÉCNICAS UTILIZADAS E PROCEDIMENTOS.
O trabalho realizou-se dentro do enfoque qualitativo e quantitativo, no qual foi feita uma pesquisa de campo, através de questionários direcionados aos docentes dos deficientes auditivos em escolas regulares, acerca de verificar a importância do uso da língua de sinais.
QUESTIONARIO
1- Você é a favor da inclusão de alunos surdos nas classes regulares?
( ) sim ( )não ( ) parcialmente
2- Você acha que os alunos surdos se desenvolvem melhor em escolas especiais?
( ) sim ( )não ( ) parcialmente
3- Você tem dificuldades em se comunicar com o surdo?
( ) sim ( )não ( ) parcialmente
4- Você é favor da língua de sinais em sala de aula?
( ) sim ( )não ( ) parcialmente
5- É conveniente para você ter um interprete em sala e aula todo o tempo?
( ) sim ( )não ( ) parcialmente
6- Você concorda que alem do interprete o professor também deve aprender libras?
( ) sim ( )não ( ) parcialmente
7- A escola que você trabalha esta apta para receber o portador de deficiência auditiva?
( ) sim ( )não ( ) parcialmente
8- Você concorda que bem estruturado linguisticamente o surdo consegue desenvolver competências e habilidades na leitura, escrita, e raciocínio lógico matemático ao ponto de se tornarem autônomos?
( ) sim ( )não ( ) parcialmente
2.4 ANÁLISE DOS RESULTADOS
Com base nos dados coletados através dos questionários, pode-se constatar de fato a importância da língua de sinais na educação dos portadores de deficiência auditiva em classes regulares.
Conforme a presente pesquisa pode-se analisar que 56,6% dos professores das três instituições são a favor da inclusão dos surdos nas classes normais, mesmo 80% destes achando que as escolas onde trabalham não estão aptas para receber portadores de deficiência auditiva.
Totaliza-se em 76,6% os que dizem serem a favor do uso da língua de sinais nas salas, por considerá-la importante na educação dos surdos. Porém 90% desses educadores tem dificuldades de se comunicarem com os portadores de surdez, por esse motivo 56,6 % desses são totalmente a favor da presença do intérprete na sala de aula.
Considerando-se que 90% deles acham que amparados linguisticamente os surdos podem desenvolver competências e habilidades intelectuais, encontraram-se contradições nestas opiniões, pois mesmo favoráveis à inclusão, 86,6% acham que os surdos se desenvolvem melhor em classes especiais devido ao uso exclusivo da língua de sinais. Achou-se controvérsias também nas respostas de 66,6% dos professores, que mesmo admitindo a importância da LIBRAS, não desejam de forma alguma aprendê-la.
Ao analisar as respostas dos professores percebe-se que ainda existem contradições acerca do uso da língua de sinais nas classes regulares. A lei 10436/2002 (lei da Libras) regulamentada pelo decreto 5626/2005 estabelece o uso da Libras em classes regulares, bem como a formação de profissionais para que possam garantir uma educação inclusiva em conformidade com o que diz Staimbck e Staimbck (1999) que juntos todos podem aprender.
Mais uma vez constatou-se através desta pesquisa, que a presença da língua de sinais na escola ainda representa um medo, mas que ela é importantíssima na educação dos surdos para que possam desenvolver-se em todos os seus aspectos.
3 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer desse estudo foram abordadas importantes considerações teóricas e práticas que estão relacionadas ao aprendizado do aluno surdo. Esses conhecimentos se tornaram necessários para dar sustentabilidade às nossas análises, e em particular, à importância da língua de sinais para o surdo na rede regular do ensino.
Assim, baseada no levantamento bibliográfico e nos objetivos propostos, foi possível perceber que a língua de sinais é de grande importância para o desenvolvimento cognitivo e para o processo de aprendizagem do sujeito surdo. A questão da surdez está intimamente relacionada ao uso efetivo da língua. Entretanto, o que normalmente acontece no contexto pedagógico é que o aluno surdo, sobretudo na escolarização inicial, não domina a língua oral, e o professor por sua vez, não é usuário efetivo da língua de sinais. No entanto, fica evidente que a criança surda, quando aprende através da língua de sinais tem um maior desenvolvimento intelectual dos que quando aprendem sem o uso da mesma.
Esperamos que no futuro o valor das pessoas surdas, seja realmente reconhecido e aquilo que está sendo ofertado a ele, no presente seja efetivado de forma global e irrestrita. Que não fique somente nas legislações, posto que os mesmos já perderam muito do seu tempo sendo segregados durante anos a fio em escolas especializadas, que só serviram de pano de fundo para a grande discriminação que assola o país, além de não acrescentar nada ao processo de desenvolvimento do surdo enquanto pessoa ou como cidadão.
4. REFERÊNCIAS
BEUREN, Ilse Maria (org). Como elaborar trabalhos monográficos em contabilidade. São Paulo: Atlas, 2004.
BOCK, Ana Mercês Bahia. Uma Introdução ao Estudo de Psicologia. 13ª edição São Paulo: Saraiva, 2002.
BOTELHO, Paula. Linguagem e Letramento na educação dos surdos – Ideologias e práticas pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.
BRASIL, Constituição da Republica Federativa do Brasil. Rio de Janeiro: Degrau cultural 1988.
BRASIL, Congresso nacional. Lei nº. 10436, de 24 de abril de 2002. Brasília, 2002.
BRASIL, Congresso nacional. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB nº 9394 e 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da União, 14 de setembro de 2001.
BRASIL, Decreto nº. 5626 de 22 de dezembro de 2005, disponível em: http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/dec5626.pdf Acesso em 21 de setembro de 2008
BRASIL, Secretaria de Educação Especial. Subsídios para Organizações e Funcionamento de Serviços de Educação Especial: área de deficiência auditiva/ Ministério da educação e do Desporto, Secretaria de educação Especial – Brasília: MEC/ SEESP, 1995.
CARVALHO, Rosita Edler. Educação Inclusiva com os Pingos nos Is. Porto Alegre: Mediação, 2004.
COLL, César; PALÁCIOS Jésus; MARCHESI, Álvaro. Desenvolvimento psicológico e educação: necessidades educativas especiais e aprendizagem escolar. Porto Alegre: Artes Medicas, 1995.
DECLARAÇAO DE SALAMANCA, Espanha, 1994, disponível em http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf acesso em: 22 de setembro de 2008.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI. Rio de Janeiro Nova Fronteira, 1999.
GOLDFELD, Márcia. A Criança Surda: linguagem e cognição numa perspectiva sóciointeracionista. São Paulo: Plexus Editora, 2002.
KIRK, Samuel A; GALLAGHER, James. Educação da criança excepcional. 3ª edição São Paulo: Martins Fontes, 1996.
LUBISCO, Nédia Maria Lienert; VIEIRA, Sônia Chagas. Manual de Estilo Acadêmico: monografia, dissertação e teses. Revisão e sugestão de Isnara Veiga Santana 2 ed. Ver E ampl. Salvador: EDUFBA, 2003.
PERLIN, Gladis T. T. Identidades Surdas. In: SKILAR, Carlos (org). A Surdez: um Olhar Sobre as Diferenças. Editora Mediação. Porto Alegre, 2005.
QUADROS, Ronice Muller. Educação de Surdos: a aquisição da linguagem. Porto Alegre, 2001.
QUADROS, Ronice Muller, SHIMIEDT, Magali L.P. Idéias para ensinar português para alunos surdos. Brasília: MEC, SEESP, 2006.
REGO, Tereza Cristina, Vygotsky, uma perspectiva histórica cultural da educação. 13. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1994.
REILY, Lúcia. Escola Inclusiva: linguagem e mediação. Campinas, SP: Papirus, 2004.
SOARES, Maria Aparecida Leite. Educação do Surdo no Brasil. Campinas: Autores associados, 1999.
SKILAR, Carlos (org). A Surdez: um Olhar Sobre as Diferenças. Editora Mediação. Porto Alegre, 2005.
STAIMBACK, Susan; STAIMBACK William. Inclusão um guia para educadores, Porto Alegre: Artes Medicas, Sul, 1999.
FONTE:
http://www.administradores.com.br/artigos/administracao-e-negocios/a-importancia-da-lingua-de-sinais-na-escola-regular/28123/
Acesso: 27-07-2013
quarta-feira, 24 de julho de 2013
domingo, 21 de julho de 2013
terça-feira, 16 de julho de 2013
Educação no Brasil: a História das rupturas
José Luiz de Paiva Bello
2001
Introdução
A História da Educação Brasileira não é uma História difícil
de ser estudada e compreendida. Ela evolui em rupturas marcantes e fáceis de
serem observadas.
A primeira grande ruptura travou-se com a chegada mesmo dos portugueses
ao território do Novo Mundo. Não podemos deixar de reconhecer que os
portugueses trouxeram um padrão de educação próprio da Europa, o que não quer
dizer que as populações que por aqui viviam já não possuíam características
próprias de se fazer educação. E convém ressaltar que a educação que se
praticava entre as populações indígenas não tinha as marcas repressivas do
modelo educacional europeu.
Num programa de entrevista na televisão o indigenísta
Orlando Villas Boas contou um fato observado por ele
numa aldeia Xavante que retrata bem a característica educacional entre os
índios: Orlando observava uma mulher que fazia alguns potes de barro. Assim que
a mulher terminava um pote seu filho, que estava ao lado dela, pegava o pote
pronto e o jogava ao chão quebrando. Imediatamente ela iniciava outro e,
novamente, assim que estava pronto, seu filho repetia o mesmo ato e o jogava no
chão. Esta cena se repetiu por sete potes até que Orlando não se conteve e se
aproximou da mulher Xavante e perguntou por que ela deixava o menino quebrar o
trabalho que ela havia acabado de terminar. No que a mulher índia respondeu:
"- Porque ele quer."
Podemos também obter algumas noções de como era feita a
educação entre os índios na série Xingu,
produzida pela extinta Rede Manchete de Televisão. Neste seriado podemos ver
crianças indígenas subindo nas estruturas de madeira das construções das ocas,
numa altura inconcebivelmente alta.
Quando os jesuítas chegaram por aqui eles não trouxeram
somente a moral, os costumes e a religiosidade européia; trouxeram também os
métodos pedagógicos.
Este método funcionou absoluto durante 210 anos, de 1549 a
1759, quando uma nova ruptura marca a História da Educação no Brasil: a
expulsão dos jesuítas por Marquês de Pombal. Se existia alguma
coisa muito bem estruturada em termos de educação o que se viu a seguir
foi o mais absoluto caos. Tentou-se as aulas régias,
o subsídio literário, mas o caos continuou até que a Família Real,
fugindo de Napoleão na Europa, resolve transferir o Reino para o Novo Mundo.
Na verdade não se conseguiu implantar um sistema educacional
nas terras brasileiras, mas a vinda da Família Real permitiu uma nova ruptura
com a situação anterior. Para preparar terreno para sua estadia no Brasil D.
João VI abriu Academias Militares, Escolas de Direito e Medicina, a Biblioteca
Real, o Jardim Botânico e, sua iniciativa mais marcante em termos de mudança, a
Imprensa Régia. Segundo alguns autores o Brasil foi finalmente
"descoberto" e a nossa História passou a ter uma complexidade maior.
A educação, no entanto, continuou a ter uma importância
secundária. Basta ver que, enquanto nas colônias espanholas já existiam muitas
universidades, sendo que em 1538 já existia a Universidade de São Domingos e em
1551 a do México e a de Lima, a nossa primeira
Universidade só surgiu em 1934, em São Paulo.
Por todo o Império, incluindo D. João VI, D.
Pedro I e D. Pedro II, pouco se fez pela educação brasileira e muitos
reclamavam de sua qualidade ruim. Com a Proclamação da República tentou-se várias reformas que pudessem dar uma nova guinada,
mas se observarmos bem, a educação brasileira não sofreu um processo de
evolução que pudesse ser considerado marcante ou significativo em termos de
modelo.
Até os dias de hoje muito tem se mexido no planejamento
educacional, mas a educação continua a ter as mesmas características impostas
em todos os países do mundo, que é a de manter o "status quo" para aqueles que freqüentam os bancos
escolares.
Concluindo podemos dizer que a Educação Brasileira tem um
princípio, meio e fim bem demarcado e facilmente observável. E é isso que
tentamos passar neste texto.
Os períodos foram divididos a partir das concepções do autor
em termos de importância histórica.
Se considerarmos a História como um
processo em eterna evolução não podemos considerar este trabalho como
terminado. Novas rupturas estão acontecendo no exato momento em que esse texto está
sendo lido. A educação brasileira evolui em saltos desordenados, em diversas direções.
Período
Jesuítico (1549 - 1759)
A educação indígena foi interrompida com a chegada dos
jesuítas. Os primeiros chegaram ao território brasileiro em março de 1549.
Comandados pelo Padre Manoel de Nóbrega,
quinze dias após a chegada edificaram a primeira escola elementar brasileira,
em Salvador, tendo como mestre o Irmão
Vicente Rodrigues, contando apenas 21 anos. Irmão Vicente tornou-se o
primeiro professor nos moldes europeus, em terras brasileiras, e durante mais
de 50 anos dedicou-se ao ensino e a propagação da fé religiosa.
No Brasil os jesuítas se dedicaram à pregação da fé católica
e ao trabalho educativo. Perceberam que não seria possível converter os índios
à fé católica sem que soubessem ler e escrever. De Salvador a obra jesuítica estendeu-se para o sul e, em 1570, vinte e um anos após a
chegada, já era composta por cinco escolas de instrução elementar (Porto
Seguro, Ilhéus, São Vicente, Espírito Santo e São Paulo de Piratininga) e três
colégios (Rio de Janeiro, Pernambuco e Bahia).
Quando os jesuítas chegaram por aqui eles não trouxeram
somente a moral, os costumes e a religiosidade européia; trouxeram também os
métodos pedagógicos. Todas as escolas jesuítas eram regulamentadas por um
documento, escrito por Inácio de Loiola, o Ratio
Studiorum. Eles não se limitaram ao ensino das
primeiras letras; além do curso elementar mantinham cursos de Letras e
Filosofia, considerados secundários, e o curso de Teologia e Ciências Sagradas,
de nível superior, para formação de sacerdotes. No curso de Letras estudava-se
Gramática Latina, Humanidades e Retórica; e no curso de Filosofia estudava-se
Lógica, Metafísica, Moral, Matemática e Ciências Físicas e Naturais.
Este modelo funcionou absoluto durante 210 anos, de 1549 a
1759, quando uma nova ruptura marca a História da Educação no Brasil: a
expulsão dos jesuítas por Marquês de Pombal. Se existia algo muito bem
estruturado, em termos de educação, o que se viu a seguir foi o mais absoluto
caos.
No momento da expulsão os jesuítas tinham 25 residências, 36
missões e 17 colégios e seminários, além de seminários menores e escolas de
primeiras letras instaladas em todas as cidades onde havia casas da Companhia
de Jesus. A educação brasileira, com isso, vivenciou uma grande ruptura
histórica num processo já implantado e consolidado como modelo educacional.
Período
Pombalino (1760 - 1808)
Com a expulsão saíram do Brasil 124 jesuítas da Bahia, 53 de
Pernambuco, 199 do Rio de Janeiro e 133 do Pará. Com eles levaram também a
organização monolítica baseada no Ratio Studiorum.
Desta ruptura, pouca coisa restou de prática educativa no
Brasil. Continuaram a funcionar o Seminário Episcospal,
no Pará, e os Seminários de São José e São Pedro, que não se encontravam sob a
jurisdição jesuítica; a Escola de Artes e Edificações Militares, na Bahia, e a
Escola de Artilharia, no Rio de Janeiro.
Os jesuítas foram expulsos das colônias em função de radicais
diferenças de objetivos com os dos interesses da Corte. Enquanto os jesuítas
preocupavam-se com o proselitismo e o noviciado, Pombal pensava em reerguer
Portugal da decadência que se encontrava diante de outras potências européias
da época. Além disso, Lisboa passou por um terremoto que destruiu parte
significativa da cidade e precisava ser reerguida. A educação jesuítica não
convinha aos interesses comerciais emanados por Pombal. Ou seja, se as escolas
da Companhia de Jesus tinham por objetivo servir aos interesses da fé, Pombal
pensou em organizar a escola para servir aos interesses do Estado.
Através do alvará de 28 de junho de 1759, ao mesmo tempo em
que suprimia as escolas jesuíticas de Portugal e de todas as colônias, Pombal
criava as aulas régias de Latim,
Grego e Retórica. Criou também a Diretoria de Estudos
que só passou a funcionar após o afastamento de Pombal. Cada aula régia era
autônoma e isolada, com professor único e uma não se articulava com as outras.
Portugal logo percebeu que a educação no Brasil estava
estagnada e era preciso oferecer uma solução. Para isso instituiu o "subsídio literário" para
manutenção dos ensinos primário e médio. Criado em 1772 o “subsídio” era uma
taxação, ou um imposto, que incidia sobre a carne verde, o vinho, o vinagre e a
aguardente. Além de exíguo, nunca foi cobrado com regularidade e os professores
ficavam longos períodos sem receber vencimentos a espera de uma solução vinda
de Portugal.
Os professores geralmente não tinham preparação para a
função, já que eram improvisados e mal pagos. Eram nomeados por indicação ou
sob concordância de bispos e se tornavam "proprietários" vitalícios
de suas aulas régias.
O resultado da decisão de Pombal foi que, no
princípio do século XIX, a educação brasileira estava reduzida a praticamente
nada. O sistema jesuítico foi desmantelado e nada que pudesse chegar próximo
deles foi organizado para dar continuidade a um trabalho de educação.
Período Joanino (1808 – 1821)
A vinda da Família Real, em 1808, permitiu uma nova ruptura
com a situação anterior. Para atender as necessidades de sua estadia no Brasil,
D. João VI abriu Academias Militares, Escolas de Direito e Medicina, a
Biblioteca Real, o Jardim Botânico e, sua iniciativa mais marcante em termos de
mudança, a Imprensa Régia. Segundo alguns autores, o Brasil foi finalmente
"descoberto" e a nossa História passou a ter uma complexidade maior.
O surgimento da imprensa permitiu que os fatos e as idéias fossem divulgados e
discutidos no meio da população letrada, preparando terreno propício para as
questões políticas que permearam o período seguinte da História do Brasil.
A educação, no entanto, continuou a ter uma importância
secundária. Para o professor Lauro de Oliveira Lima (1921- ) "a 'abertura dos portos',
além do significado comercial da expressão, significou a permissão dada aos
'brasileiros' (madereiros de pau-brasil) de tomar
conhecimento de que existia, no mundo, um fenômeno chamado civilização e
cultura".
Período Imperial (1822 - 1888)
D. João VI volta a Portugal em 1821. Em 1822 seu filho D.
Pedro I proclama a Independência do Brasil e, em 1824, outorga a primeira Constituição brasileira. O Art. 179
desta Lei Magna dizia que a
"instrução primária é gratuita para todos os cidadãos".
Em 1823, na tentativa de se suprir a falta de professores
institui-se o Método Lancaster,
ou do "ensino mútuo", onde um aluno treinado (decurião) ensinava um grupo de dez alunos (decúria) sob a
rígida vigilância de um inspetor.
Em 1826 um Decreto institui quatro graus de instrução: Pedagogias (escolas primárias), Liceus, Ginásios e Academias.
Em 1827 um projeto de lei propõe a criação de pedagogias em todas as cidades e
vilas, além de prever o exame na seleção de professores, para nomeação.
Propunha ainda a abertura de escolas para meninas.
Em 1834 o Ato
Adicional à Constituição dispõe que as províncias passariam a ser responsáveis pela administração do ensino primário e
secundário. Graças a isso, em 1835, surge a primeira Escola Normal do país, em
Niterói. Se houve intenção de bons resultados não foi o que aconteceu, já que,
pelas dimensões do país, a educação brasileira perdeu-se mais uma vez, obtendo
resultados pífios.
Em 1837, onde funcionava o Seminário de São Joaquim, na cidade do Rio de Janeiro, é criado o Colégio Pedro II, com o objetivo de se
tornar um modelo pedagógico para o curso secundário. Efetivamente o Colégio Pedro II não conseguiu se
organizar até o fim do Império para atingir tal objetivo.
Até a Proclamação da
República, em 1889 praticamente nada se fez de concreto pela educação
brasileira. O Imperador D. Pedro II, quando perguntado que profissão escolheria
não fosse Imperador, afirmou que gostaria de ser "mestre-escola".
Apesar de sua afeição pessoal pela tarefa educativa, pouco foi feito, em sua
gestão, para que se criasse, no Brasil, um sistema educacional.
Período da Primeira República (1889 - 1929)
A República proclamada adotou o modelo político americano
baseado no sistema presidencialista. Na organização escolar percebe-se
influência da filosofia positivista. A
Reforma de Benjamin Constant tinha como princípios orientadores a liberdade e laicidade do ensino,
como também a gratuidade da escola primária. Estes princípios seguiam a
orientação do que estava estipulado na Constituição brasileira.
Uma das intenções desta Reforma era transformar o ensino em
formador de alunos para os cursos superiores e não apenas preparador. Outra
intenção era substituir a predominância literária pela científica.
Esta Reforma foi bastante criticada: pelos positivistas, já
que não respeitava os princípios pedagógicos de Comte; pelos que defendiam a
predominância literária, já que o que ocorreu foi o acréscimo de matérias
científicas às tradicionais, tornando o ensino enciclopédico.
O Código Epitácio
Pessoa, de 1901, inclui a lógica entre as matérias e retira a biologia,
a sociologia e a moral, acentuando, assim, a parte literária em detrimento da
científica.
A Reforma Rivadávia Correa, de 1911, pretendeu que o curso
secundário se tornasse formador do cidadão e não como simples promotor a um
nível seguinte. Retomando a orientação positivista, prega a liberdade de ensino,
entendendo-se como a possibilidade de oferta de ensino que não seja por escolas
oficiais, e de freqüência. Além disso, prega ainda a abolição do diploma em
troca de um certificado de assistência e aproveitamento e transfere os exames
de admissão ao ensino superior para as faculdades. Os resultados desta Reforma
foram desastrosos para a educação brasileira.
Num período complexo da História do Brasil surge a Reforma João Luiz Alves que introduz a
cadeira de Moral e Cívica com a intenção de tentar combater os protestos
estudantis contra o governo do presidente Arthur Bernardes.
A década de vinte foi marcada por diversos fatos relevantes
no processo de mudança das características políticas brasileiras. Foi nesta
década que ocorreu o Movimento dos 18 do Forte (1922), a Semana de Arte Moderna
(1922), a fundação do Partido Comunista (1922), a Revolta Tenentista (1924) e a
Coluna Prestes (1924 a 1927).
Além disso, no que se refere à educação, foram realizadas
diversas reformas de abrangência estadual, como as de Lourenço Filho, no Ceará,
em 1923, a de Anísio Teixeira, na Bahia, em 1925, a de Francisco Campos e Mario
Casassanta, em Minas, em 1927, a de Fernando de
Azevedo, no Distrito Federal (atual Rio de Janeiro), em 1928 e a de Carneiro
Leão, em Pernambuco, em 1928.
Período
da Segunda República (1930 - 1936)
A Revolução de 30 foi o marco referencial para a entrada do
Brasil no mundo capitalista de produção. A acumulação de capital, do período
anterior, permitiu com que o Brasil pudesse investir no mercado interno e na
produção industrial. A nova realidade brasileira passou a exigir uma
mão-de-obra especializada e para tal era preciso investir na educação. Sendo
assim, em 1930, foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública e, em 1931,
o governo provisório sanciona decretos organizando o ensino secundário e as
universidades brasileiras ainda inexistentes. Estes Decretos ficaram conhecidos
como "Reforma Francisco Campos".
Em 1932 um grupo de educadores lança à
nação o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, redigido por Fernando de
Azevedo e assinado por outros conceituados educadores da época.
Em 1934 a nova Constituição (a segunda da República) dispõe,
pela primeira vez, que a educação é direito de todos, devendo ser ministrada
pela família e pelos Poderes Públicos.
Ainda em 1934, por iniciativa do governador Armando Salles
Oliveira, foi criada a Universidade de São Paulo. A primeira a ser criada e
organizada segundo as normas do Estatuto das Universidades Brasileiras de 1931.
Em 1935 o Secretário de Educação do Distrito Federal, Anísio
Teixeira, cria a Universidade do Distrito Federal, no atual município do Rio de
Janeiro, com uma Faculdade de Educação na qual se situava o Instituto de
Educação.
Período
do Estado Novo (1937 - 1945)
Refletindo tendências fascistas é outorgada uma nova
Constituição em 1937. A orientação político-educacional para o mundo
capitalista fica bem explícita em seu texto sugerindo a preparação de um maior
contingente de mão-de-obra para as novas atividades abertas pelo mercado. Neste
sentido a nova Constituição enfatiza o ensino pré-vocacional e profissional.
Por outro lado propõe que a arte, a ciência e o ensino sejam
livres à iniciativa individual e à associação ou pessoas coletivas públicas e
particulares, tirando do Estado o dever da educação. Mantém ainda a gratuidade
e a obrigatoriedade do ensino primário Também dispõe como obrigatório o ensino
de trabalhos manuais em todas as escolas normais, primárias e secundárias.
No contexto político o estabelecimento do Estado Novo, segundo
a historiadora Otaíza Romanelli,
faz com que as discussões sobre as questões da educação, profundamente ricas no
período anterior, entrem "numa espécie de hibernação". As
conquistas do movimento renovador, influenciando a Constituição de 1934, foram
enfraquecidas nessa nova Constituição de 1937. Marca uma distinção entre o
trabalho intelectual, para as classes mais favorecidas, e o trabalho manual,
enfatizando o ensino profissional para as classes mais desfavorecidas.
Em 1942, por iniciativa do Ministro Gustavo Capanema, são
reformados alguns ramos do ensino. Estas Reformas receberam o nome de Leis Orgânicas do Ensino, e são
compostas por Decretos-lei que criam o Serviço
Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI e valoriza o ensino
profissionalizante.
O ensino ficou composto, neste período, por cinco anos de
curso primário, quatro de curso ginasial e três de colegial, podendo ser na
modalidade clássico ou científico. O ensino colegial perdeu o seu caráter
propedêutico, de preparatório para o ensino superior, e passou a se preocupar
mais com a formação geral. Apesar dessa divisão do ensino secundário, entre
clássico e científico, a predominância recaiu sobre o científico, reunindo
cerca de 90% dos alunos do colegial.
Período
da Nova República (1946
- 1963)
O fim do Estado Novo consubstanciou-se na adoção de uma nova
Constituição de cunho liberal e democrático. Esta nova Constituição, na área da
Educação, determina a obrigatoriedade de se cumprir o ensino primário e dá
competência à União para legislar sobre diretrizes e bases da educação
nacional. Além disso, a nova Constituição fez voltar o preceito de que a educação é direito de todos, inspirada nos
princípios proclamados pelos Pioneiros,
no Manifesto dos Pioneiros da Educação
Nova, nos primeiros anos da década de 30.
Ainda em 1946 o então Ministro Raul Leitão da Cunha
regulamenta o Ensino Primário e o Ensino Normal, além de criar o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial -
SENAC, atendendo as mudanças exigidas pela sociedade após a Revolução de 1930.
Baseado nas doutrinas emanadas pela Carta Magna de 1946, o
Ministro Clemente Mariani, cria uma comissão com o objetivo de elaborar um
anteprojeto de reforma geral da educação nacional. Esta comissão, presidida
pelo educador Lourenço Filho, era organizada em três subcomissões: uma para o
Ensino Primário, uma para o Ensino Médio e outra para o Ensino Superior. Em
novembro de 1948 este anteprojeto foi encaminhado à Câmara Federal, dando
início a uma luta ideológica em torno das propostas apresentadas. Num primeiro
momento as discussões estavam voltadas às interpretações contraditórias das
propostas constitucionais. Num momento posterior, após a apresentação de um
substitutivo do Deputado Carlos Lacerda, as discussões mais marcantes
relacionaram-se à questão da responsabilidade do Estado quanto à educação,
inspirados nos educadores da velha geração de 1930, e a participação das
instituições privadas de ensino.
Depois de 13 anos de acirradas discussões foi promulgada a Lei 4.024, em 20 de dezembro de 1961,
sem a pujança do anteprojeto original, prevalecendo as reivindicações da Igreja
Católica e dos donos de estabelecimentos particulares de ensino no confronto
com os que defendiam o monopólio estatal para a oferta da educação aos
brasileiros.
Se as discussões sobre a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional foi o fato
marcante, por outro lado muitas iniciativas marcaram este período como, talvez,
o mais fértil da História da Educação
no Brasil: em 1950, em Salvador, no Estado da Bahia, Anísio Teixeira
inaugura o Centro Popular de Educação
(Centro Educacional Carneiro Ribeiro), dando início a sua idéia de escola-classe
e escola-parque; em
1952, em Fortaleza, Estado do Ceará, o educador Lauro de Oliveira Lima inicia
uma didática baseada nas teorias científicas de Jean Piaget: o Método Psicogenético; em 1953 a
educação passa a ser administrada por um Ministério próprio: o Ministério da Educação e Cultura; em
1961 a tem inicio uma campanha de alfabetização, cuja didática, criada pelo
pernambucano Paulo Freire, propunha alfabetizar em 40 horas adultos
analfabetos; em 1962 é criado o Conselho Federal de Educação, que substitui o Conselho Nacional de Educação e os Conselhos Estaduais de Educação e, ainda em 1962 é criado o Plano Nacional de Educação e o Programa Nacional de Alfabetização,
pelo Ministério da Educação e Cultura,
inspirado no Método Paulo Freire.
Período
do Regime Militar (1964
- 1985)
Em 1964, um golpe militar aborta todas as iniciativas de se
revolucionar a educação brasileira, sob o pretexto de que as propostas eram
"comunizantes e subversivas".
O Regime Militar espelhou na educação o
caráter anti-democrático de sua proposta ideológica de
governo: professores foram presos e demitidos; universidades foram invadidas;
estudantes foram presos e feridos, nos confronto com a polícia, e alguns foram
mortos; os estudantes foram calados e a União Nacional dos Estudantes proibida
de funcionar; o Decreto-Lei 477 calou a boca de alunos e professores.
Neste período deu-se a grande expansão das universidades no
Brasil. Para acabar com os "excedentes" (aqueles que tiravam notas
suficientes para serem aprovados, mas não conseguiam vaga para estudar), foi
criado o vestibular classificatório.
Para erradicar o analfabetismo foi criado
o Movimento Brasileiro de Alfabetização – MOBRAL, aproveitando-se, em sua
didática, do expurgado Método Paulo Freire. O MOBRAL propunha erradicar o
analfabetismo no Brasil... Não conseguiu. E, entre denúncias de corrupção,
acabou por ser extinto e, no seu lugar criou-se a Fundação Educar.
É no período mais cruel da ditadura militar, onde qualquer
expressão popular contrária aos interesses do governo era abafada, muitas vezes
pela violência física, que é instituída a Lei 5.692, a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional, em 1971. A característica mais marcante desta Lei
era tentar dar a formação educacional um cunho profissionalizante.
No fim do Regime Militar a discussão sobre as questões
educacionais já haviam perdido o seu sentido pedagógico
e assumido um caráter político. Para isso contribuiu a participação mais ativa
de pensadores de outras áreas do conhecimento que passaram a falar de educação
num sentido mais amplo do que as questões pertinentes à escola, à sala de aula,
à didática, à relação direta entre professor e estudante e à dinâmica escolar
em si mesma. Impedidos de atuarem em suas funções, por questões políticas
durante o Regime Militar, profissionais de outras áreas,
distantes do conhecimento pedagógico, passaram a assumir postos na área da
educação e a concretizar discursos em nome do saber pedagógico.
No bojo da nova Constituição, um Projeto de Lei para uma nova
LDB foi encaminhado à Câmara Federal, pelo Deputado Octávio Elísio,
em 1988. No ano seguinte o Deputado Jorge Hage enviou
à Câmara um substitutivo ao Projeto e, em 1992, o Senador Darcy Ribeiro
apresenta um novo Projeto que acabou por ser aprovado em dezembro de 1996, oito
anos após o encaminhamento do Deputado Octávio Elísio.
Neste período, do fim do Regime Militar aos dias de hoje, a
fase politicamente marcante na educação, foi o trabalho do economista e
Ministro da Educação Paulo Renato de Souza. Logo no início de sua gestão,
através de uma Medida Provisória extinguiu o Conselho Federal de Educação e
criou o Conselho Nacional de Educação, vinculado ao Ministério da Educação e
Cultura. Esta mudança tornou o Conselho menos burocrático e mais político.
Mesmo que possamos não concordar com a forma como foram
executados alguns programas, temos que reconhecer que, em toda a História da
Educação no Brasil, contada a partir do descobrimento, jamais houve execução de
tantos projetos na área da educação numa só administração.
O mais contestado deles foi o
Exame Nacional de Cursos e o seu "Provão", onde os alunos das
universidades têm que realizar uma prova ao fim do curso para receber seus
diplomas. Esta prova, em que os alunos podem simplesmente assinar a ata de
presença e se retirar sem responder nenhuma questão, é levada em consideração
como avaliação das instituições. Além do mais, entre outras questões, o exame
não diferencia as regiões do país.
Até os dias de hoje muito tem se mexido no planejamento
educacional, mas a educação continua a ter as mesmas características impostas
em todos os países do mundo, que é mais o de manter o "status quo", para aqueles que freqüentam os bancos
escolares, e menos de oferecer conhecimentos básicos, para serem aproveitados
pelos estudantes em suas vidas práticas.
Concluindo podemos dizer que a História da Educação
Brasileira tem um princípio, meio e fim bem demarcado e facilmente observável.
Ela é feita em rupturas marcantes, onde em cada período determinado teve
características próprias.
A bem da verdade, apesar de toda essa evolução e rupturas
inseridas no processo, a educação brasileira não evoluiu muito no que se refere
à questão da qualidade. As avaliações, de todos os níveis, estão priorizadas na
aprendizagem dos estudantes, embora existam outros critérios. O que podemos
notar, por dados oferecidos pelo próprio Ministério da Educação, é que os
estudantes não aprendem o que as escolas se propõem a ensinar. Somente uma
avaliação realizada em 2002 mostrou que 59% dos estudantes que concluíam a 4ª
série do Ensino Fundamental não sabiam ler e escrever.
Embora os Parâmetros Curriculares Nacionais estejam sendo
usados como norma de ação, nossa educação só teve caráter nacional no período
da Educação jesuítica. Após isso o que se presenciou foi o caos e muitas
propostas desencontradas que pouco contribuíram para o desenvolvimento da
qualidade da educação oferecida.
É provável que estejamos próximos de uma nova ruptura. E
esperamos que ela venha com propostas desvinculadas do modelo europeu de
educação, criando soluções novas em respeito às características brasileiras.
Como fizeram os países do bloco conhecidos como Tigres Asiáticos, que buscaram
soluções para seu desenvolvimento econômico investindo em educação. Ou como fez
Cuba que, por decisão política de governo, erradicou o analfabetismo em apenas
um ano e trouxe para a sala de aula todos os cidadãos cubanos.
Na evolução da História da Educação brasileira a próxima
ruptura precisaria implantar um modelo que fosse único, que atenda às
necessidades de nossa população e que seja eficaz.
REFERÊNCIAS
LIMA, Lauro de Oliveira. Estórias
da educação no Brasil: de Pombal a Passarinho. 3. ed. Rio de Janeiro:
Brasília, 1969. 363 p.
PILLETTI, Nelson. Estrutura
e funcionamento do ensino de 1o grau. 22. ed. São Paulo:
Ática, 1996.
________ . Estrutura e
funcionamento do ensino de 2o grau. 3. ed. São Paulo:
Ática, 1995.
________ . História da
educação no Brasil. 6. ed. São Paulo: Ática, 1996a.
ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da educação no Brasil.
13. ed. Petrópolis: Vozes, 1991.
BELLO, José Luiz de Paiva. Educação no Brasil: a História das rupturas. Pedagogia em Foco, Rio de Janeiro, 2001. Disponível em: <http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/heb14.htm>. Acesso em: dia mes ano
Fonte:
http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/heb14.htm
sábado, 13 de julho de 2013
sexta-feira, 12 de julho de 2013
Língua Brasileira de Sinais
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre. https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_brasileira_de_sinais
A língua brasileira de sinais (LIBRAS) é a língua de sinaisPB (língua gestualPE) usada pela maioria dos surdos dos centros urbanos brasileiros1 e reconhecida pela Lei.2 3 É derivada tanto de uma língua de sinais autóctone quanto da língua gestual francesa; por isso, é semelhante a outras línguas de sinais da Europa e da América. A LIBRAS não é a simples gestualização da língua portuguesa, e sim uma língua à parte, como o comprova o fato de que em Portugal usa-se uma língua de sinais diferente, a língua gestual portuguesa (LGP).
Assim como as diversas línguas naturais e humanas existentes, ela é composta por níveis linguísticos como: fonologia, morfologia, sintaxe e semântica. Da mesma forma que nas línguas orais-auditivas existem palavras, nas línguas de sinais também existem itens lexicais, que recebem o nome de sinais. A diferença é sua modalidade de articulação, a saber visual-espacial, ou cinésico-visual, para outros. Assim sendo, para se comunicar em Libras, não basta apenas conhecer sinais. É necessário conhecer a sua gramática para combinar as frases, estabelecendo comunicação. Os sinais surgem da combinação de configurações de mão, movimentos e de pontos de articulação — locais no espaço ou no corpo onde os sinais são feitos, os quais, juntos compõem as unidades básicas dessa língua. Assim, a Libras se apresenta como um sistema linguístico de transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil. Como em qualquer língua, também na libras existem diferenças regionais. Portanto, deve-se ter atenção às suas variações em cada unidade federativa do Brasil.
Breve Historico da Lingua Brasileira de Sinais
O Instituto dos Surdos-Mudos, hoje, Instituto Nacional da Educação de Surdos (INES) foi a primeira escola para surdos no Brasil, fundada em 1857. Foi a partir deste, com a miscigenação da antiga língua de sinais brasileira com a Língua de Sinais Francesa, que, definitivamente, nasceu a Língua Brasileira de Sinais (Libras)
Por ser a única instituição para surdos no país e no continente, o INES foi muito procurado por brasileiros e estrangeiros, virando referencia na educação, socialização e profissionalização de surdos.
No entanto, em 1880, houve em Milão um Congresso que proibiu a Língua de Sinais (gestual), achou-se por melhor adotar a oralização julgando que esta seria de melhor valia para a educação e o aprendizado dos surdos. Muitos surdos e professores criticaram tal ação, pois legitimavam a comunicação sinalizada.
Através de diversos movimentos e muita pesquisa na área, foi legitimada como Língua a comunicação gestual entre surdos. Foi apenas no fim do século XX que os movimentos se intensificaram querendo a oficialização da Língua Brasileira de Sinais (Libras), em 1993 o projeto de lei entrou na longa batalha para a regulamentação da Libras no país.
Apenas no ano de 2002 a Língua Brasileira de Sinais foi oficialmente reconhecida e aceita como segunda língua oficial brasileira, através da Lei 10.436, de 24 de abril de 2002. Mesmo com um andamento lento o progresso para a cultura Surda acontece. O século XXI começou e fez a LIBRAS realmente avançar. Em 2005, através do decreto 5.626 a Língua brasileira de sinais foi regulamentada como disciplina curricular. Já em 2007, a estrutura de LÍNGUA foi aplicada a Libras, já que ela é uma língua nata e possui complexidades próprias e comunicação eficaz. Em 2010 foi regulamentada a profissão de Tradutor\ Interprete de Libras, simbolizando mais uma grande conquista.
É dever do Poder Publico garantir acesso e educação para surdos nas escolas regulares de ensino, garantindo seu aprendizado e progressão educacional.
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Legalidade da LIBRAS
Estão garantidas no Brasil, por parte do poder público em geral e empresas concessionárias de serviços públicos, formas institucionalizadas de apoiar o uso e difusão da Língua Brasileira de Sinais como meio de comunicação objetiva e de utilização corrente das comunidades surdas do Brasil. De acordo com as normas legais em vigor no País, as instituições públicas e empresas concessionárias de serviços públicos de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado aos portadores de deficiência auditiva. O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais, municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão do ensino da Língua Brasileira de Sinais nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e superior. O governo do estado brasileiro de São Paulo produziu um dicionário voltado para os surdos, elaborado com o intuito de diminuir ao máximo a exclusão digital. Produzido em CD-ROM, o dicionário tem 43 606 verbetes, 3 000 vídeos, 4 500 sinônimos e cerca de 3 500 imagens.Convenções para a transcrição
A Libras, como as outras línguas de sinais, não tem um sistema de escrita largamente adotado, embora existam algumas propostas, como a SignWriting, que estão sendo usadas em algumas escolas e publicações. Na falta de uma escrita própria, a Libras tem sido transcrita usando palavras em português que correspondam ao significado dos sinais. Para designar que a palavra em português indica um sinal, é grafada convencionalmente em letras maiúsculas. Por exemplo: LUA, BOLO.Referências
- ↑ CARVALHO, Paulo Vaz de. breve História dos Surdos no Mundo. [S.l.]: SurdUniverso, 2007. 140 p.
- ↑ Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002 — Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras e dá outras providências.
- ↑ Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005 — Regulamenta a Lei no 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras, e o art. 18 da Lei no 10.098, de 19 de dezembro de 2000.
- ↑ {Figueira, Alexandre dos Santos,"Material de Apoio para o Aprendizado de Libras", PHORTE,2011,pags 339}
- ↑ {http://ines.gov.br/default.aspx%7Cid=}}
- ↑ {http://www.feneis.org.br/page/libras_nacional.aspid=}}
Ligações externas
- Legenda Libras - Site bilíngue para acessibilidade de pessoas surdas para todo o Brasil, com textos interpretados da língua portuguesa para a língua brasileira de sinais.
- Libras.com.br - Site que apresenta leis, curiosidades, notícias, cadastro de intérpretes, etc, através de textos, vídeos, fotos e ilustrações.
- Portal Libras.org.br - Site com informações, legislação, notícias atualizadas, links úteis, publicações e ofertas de vários materiais educativos sobre a Língua Brasileira de Sinais.
- LETRAS-LIBRAS - Site do primeiro curso de graduação federal e à distância em Letras-Libras do Brasil.
- PGET - Site do Primeiro Programa de Pós-graduação strictu sensu de mestrado e doutorado em Estudos da Tradução no Brasil com áreas de pesquisa em torno da tradução e interpretação de língua brasileira de sinais - Libras.
- ARARA AZUL - Site da Editora que publica vários materiais acadêmicos e educativos sobre a Língua Brasileira de Sinais.
- [1] Profa. Dra. RONICE MÜLLER DE QUADROS - Site dessa Professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) especialista em investigações sobre a Libras.
- BILINGUE - Ferramenta de auxílio na alfabetização de alunos - para educadores.
- Dicionário de Libras Colaborativo - Sistema que utiliza vídeos do youtube permitindo atualização dos verbetes.
- Dicionário Libras - Traz as imagens reais, na forma de pequenos "filmes", o que facilita um aprendizado mais eficiente.
- Mais um dicionário
- INES - Instituto Nacional de Educação dos Surdos.
- FENEIS - Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos.
- sur10.net - O portal da surdez: Vídeos em LIBRAS e com legenda.
- O Decreto de Dezembro de 2005 , que garante a inclusão da LIBRAS, nos sistemas educacionais do Brasil.
- Aquisição da Linguagem de Sinais: uma entrevista com Lodenir Karnopp . Revista Virtual de Estudos da Linguagem – ReVEL. Vol. 3, n. 5, 2005.
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